quarta-feira, 28 de maio de 2025

PEDRA D'ÁGUA E AFETOS: ÁGUAS DE PESQUEIRA

 

Localização de Pedra D'Água e Afetos. Mapa de Pesqueira - IBGE

O açude de Pedra D’Água foi inaugurado em 1909 cuja bacia hidrográfica tinha a capacidade de 125 mil metros cúbicos de água. Essa informação consta no valioso trabalho “Águas de Pesqueira” - que por reconhecimento compõe o título deste artigo - escrito com técnica e concisão pelo ilustre pesqueirense Oton Augusto de Almeida citado em reportagem do Diário de Pernambuco 27/07/1967.

Os dados sobre Pedra D’Água são poucos, o que sabemos é que foi o primeiro sistema de abastecimento de água de Pesqueira. A construção foi iniciada em 1907 na administração do prefeito Francisco Sinésio de Araújo Cavalcanti (15/11/1907 – 15/11/1910) e com funcionamento a partir de 1909. De acordo com Luís Wilson (1980 p. 48) a “água foi canalizada em alguns chafarizes na ‘rua’ e casas residenciais”.

Açude Pedra D'Água em 1925. Cortesia de José Florêncio Neto.

A primeira intervenção para melhorar o açude ocorreu na administração do major Cândido Cavalcanti de Brito (15/11/1923 – 15/11/1925) onde foi feito o conserto emergencial de uma grande fenda que existia no paredão pela qual se perdia muita água. Nas palavras do prefeito: “procurei atender imediatamente aos reparos que reclamava o único reservatório da cidade, o açude de Pedra D’Água, destinado ao abastecimento da população” (Jornal do Recife, 12/07/1931).

Prefeito Cândido de Brito

Não pôde ser realizada algo mais aprofundado por conta do alto volume de água da bacia, uma vez que o ano de 1924 registrou um dos maiores índices pluviométricos da história do município de Pesqueira, onde choveu 1.299,2 milímetros. Vale salientar que nesse biênio a prefeitura investiu em abastecimento de água 3.805$130 – três contos, oitocentos e cinco e cento e trinta réis, dos quais certamente a maior parte foi no conserto do açude.

A administração do prefeito José de Almeida Maciel (20/09/1926 – 30/04/1927) que assumiu a prefeitura depois da renúncia do prefeito João Batista Muniz Falcão mesmo pelo curto período de tempo deu continuidade aos trabalhos realizando uma grande reforma no açude realizada entre novembro de 1926 e março de 1927.

Prefeito José de Almeida Maciel

Preocupado com o crescimento populacional e com os longos períodos de seca que dificultavam o acesso à agua, o prefeito José de Almeida Maciel com recursos próprios da prefeitura realizou a construção da parede de reforço do açude de Pedra D’Água com a base de 5 metros de espessura por 20 metros de extensão, na maior parte de pedra, argamassa de cimento e cal, usando 72 milheiros de tijolos de alvenaria; aumentou em 1 metro de profundidade a represa com a escavação do leito; construiu uma nova caixa d’água; e adquiriu canos para melhorar a rede de distribuição junto à empresa inglesa Mc Kinley, Swanwinck & Co. – vindos da Inglaterra, chegaram ao porto do Recife e foram transportados para Pesqueira nos trens da Great Western.

Para termos uma ideia do alto valor investido na obra de reforma do açude de Pedra D’Água, são necessárias algumas considerações: os encanamentos custaram 32 contos e 272 mil réis - divididos em 3 parcelas pagas em 10 de abril, 10 de junho e 10 de agosto de 1927; os materiais de consumo para realização da reforma foram adquiridos quase que em sua totalidade na Casa Sertaneja de Orestes Maciel e custaram 7 contos e 295 mil de réis; com folha de pessoal foram gastos 20 contos de réis – os operários estavam sob a liderança do mestre de obras Sebastião de Lima e do apontador Domingos Santa Cruz.

Após 18 anos da sua construção as intervenções feitas pelo major Cândido de Brito e José de Almeida Maciel foram fundamentais para que esse importante manancial hídrico continuasse a servir a população pesqueirense que em 1924 era de 3.905 habitantes na área urbana, sendo esta constituída por 997 habitações distribuídas em 34 logradouros.

Em 1932 a Inspetoria de Obras Contra as Secas (IOCS) sob a coordenação do engenheiro Luís Vieira realizou serviços de melhoramento e limpeza do açude no valor de 1 conto de réis. O prefeito Eliseu Elói Cavalcanti (07/10/1930 – 20/10/1934) nessa época fez a desapropriação de terras no entorno do açude no valor total de 20 contos de réis para que os serviços das obras contra as secas fossem realizados.

Por mais de 40 anos Pedra D’Água foi o único açude responsável pelo abastecimento de Pesqueira. E à medida que o tempo foi passando ele foi ficando insuficiente diante do crescimento populacional e habitacional da cidade. De acordo com o Censo a população da cidade de Pesqueira em 1940 era de 8.472 habitantes, ou seja, três vezes mais do que quando o açude de Pedra D’Água foi construído.

Prefeito Arruda Marinho

Por esta razão o prefeito João Arruda Marinho dos Santos tomou a iniciativa da construção do açude de Afetos, após ter assumido o mandato em 1⁰ de agosto de 1939, prova disso, é que já deixara provisionados recursos para que no exercício de 1940 pudesse começar a obra. Em telegrama de abril de 1940, enviado ao Interventor Agamenon Magalhães, diz estar aguardando a inspeção da Inspetoria Federal das Obras Contra as Secas (IFOCS) para começarem os serviços, uma vez que seria da responsabilidade do órgão a execução e o auxílio com 70% dos custos financeiros.

Em 27 de novembro de 1940, o Diário do Estado publicou o seguinte: “NOTICIÁRIO OFICIAL, registrando o recebimento do seguinte telegrama: “[...] De Pesqueira – Informando haver a Prefeitura dado começo aos trabalhos de construção do açude Afetos, destinado àquela cidade, orçado em 340 contos de réis, com capacidade para 550 mil metros cúbicos, em cooperação com a Inspetoria de Obras Contra as Secas, que custeará 70% do valor da mesma obra”.

Em março de 1941 foi concluída a estrada de rodagem ligando a cidade ao açude de Afetos. Em abril, o Secretário de Viação, Dr. Gercino Pontes, esteve visitando as obras. Neste mesmo ano foram investidos 147 contos de réis. No início de 1942 o número de operários passou de 60 para 120 a fim de socorrer as pessoas que sofriam com a seca.

O Diário do Estado em 27 de abril de 1943 registrava o Projeto n⁰1 da Prefeitura de Pesqueira solicitando um crédito especial de Cr$ 60.000,00 para prosseguimento das obras. Esse seria o oitavo crédito aberto, os sete anteriores somaram Cr$ 370.000,00 dos quais haviam sido gastos até o momento a importância de Cr$ 361.821,50 assim distribuídos: Cr$ 229.173,80 despesas com operários; Cr$ 81.174,80 despesas com material de consumo; e Cr$ 46.474,50 despesas com a estrada de rodagem, a colocação da galeria de descarga e etc.

Porquanto, o saldo de Cr$ 4.022,70 era insuficiente para a continuidade da obra, pois de acordo com a justificativa do projeto a fiscalização do IFOCS avaliara que o total se elevaria para Cr$ 400.000,00. Diante do embasamento o projeto recebeu parecer favorável do membro do Departamento Administrativo do Estado, Sr. Manoel Leão, sendo aprovado por todo o colegiado.

Um adendo, é que durante esse período governamental chamado de Estado Novo não existiam eleições, ou seja, o Estado através do Interventor Federal nomeava os prefeitos e com isso não havia o funcionamento das Câmaras Municipais, passando os projetos do executivo a serem submetidos à apreciação para aprovação ou não do Departamento Administrativo do Estado.

Após 4 anos do início da obra, o Diário do Estado publicava em 20 de dezembro de 1944 o telegrama do prefeito Arruda Marinho informando a conclusão do serviço de terraplanagem do açude de Afetos, faltando apenas o empedramento do sangradouro para que obra estivesse finalizada. Tendo o novo açude municipal o custo total de Cr$ 475.168,70.

No mesmo telegrama Arruda Marinho faz um apelo ao Interventor Agamenon Magalhães para que fossem iniciadas as obras de canalização, pois o projeto já estava elaborado pelo Departamento de Saneamento do Estado (DSE) e conclui dizendo que “constituiria a mais justa aspiração da laboriosa população da cidade” (DO, 20/12/44).

As obras de canalização iniciaram em 1946, possivelmente, ainda na administração de Arruda Marinho que foi prefeito de Pesqueira por 8 meses desse ano - a sua primeira passagem pela prefeitura encerrou em 20/11/1945, retornando por dois períodos em 1946 entre 12 de fevereiro a 8 de agosto e de 21 de agosto a 14 de novembro.

Arruda Marinho continuou a lutar para que a obra saísse do papel na Assembleia Legislativa de Pernambuco, visto que fora eleito deputado estadual para a legislatura 1947/1951. O Requerimento nº 74 de 13/05/1947 de sua autoria solicita a urgência para que as obras de canalização fossem intensificadas para resolver o grave problema de abastecimento de água da cidade.  Justificando que Pesqueira, um importante centro industrial com cerca de 12 mil habitantes e diversas instituições de saúde e educação, sofria com um sistema de abastecimento de água obsoleto e insuficiente, construído há mais de 30 anos. Isso comprometia a saúde pública, o desenvolvimento urbano e a expansão industrial.

Em resposta através do ofício datado de 27/05/1947 o Secretário de Viação João Holmes Sobrinho encaminha as informações obtidas junto ao DSE por meio do seu diretor-engenheiro Antônio Figueiredo informando que como não foi destinada verba no orçamento de 1947 para o Fundo de Saneamento do Interior, não é possível acelerar as obras de abastecimento de água em Pesqueira. Além disso, alerta que essas obras serão paralisadas em breve se não forem obtidos novos recursos.

De fato os recursos investidos entre os anos de 1946 e 1947 foram de apenas Cr$ 700.000,00. Diferente do período entre 1948 e 1950 onde o investimento saltou para Cr$ 2.700,00 permitindo a conclusão da obra. O que permitiu esse aumento foi um empréstimo contratado pelo governo do estado junto ao Banco do Brasil.

O prefeito Ésio Araújo em telegrama enviado ao governador Barbosa Lima Sobrinho datado de 1⁰ de abril de 1949 parabenizava-o pela assinatura do empréstimo com o Banco do Brasil dando ao governo os meios para realizar obras imprescindíveis para o estado e os municípios a exemplo da conclusão do sistema de abastecimento de água de Pesqueira por meio do açude de Afetos.

Em 4 de agosto de 1949, o jornalista Luiz Neves correspondente do Diário de Pernambuco informava que o serviço de abastecimento de água de Pesqueira estava prestes a ser concluído. Faltando a chegada dos canos, que estavam atrasados. Mas, segundo fontes, os mesmos chegariam ao Recife ainda naquele mês e seriam enviados em breve para Pesqueira com vistas a finalizar a obra.

Enfim, chegou o grande dia da inauguração do sistema de abastecimento d’água de Pesqueira – 27 de novembro de 1950. Depois de 10 anos que as obras de construção do açude de Afetos começaram e após 4 anos do início do sistema de canalização foi concretizada tão importante obra para Pesqueira, realização do sonho e da luta de tantos pesqueirenses, nos cabendo destacar os papéis dos prefeitos Arruda Marinho e Ésio Araújo.

Manchete do Diário de Pernambuco em 29/11/1950

A reportagem intitulada “Inaugurado o abastecimento d’água de Pesqueira” do Diário de Pernambuco de 29/11/1950 trás os detalhes do ato inaugural. Na ocasião, receberam o governador Barbosa Lima Sobrinho e a sua comitiva o prefeito Ésio Araújo, o deputado Arruda Marinho e o industrial Manoel de Brito que ofereceu um almoço para receber o chefe do executivo estadual.

Dentre as pessoas que compunham a comitiva do governador estavam: Artur Rui de Carvalho, secretário da Agricultura; deputado estadual José Domingues, antigo interventor federal no Estado, em cuja gestão o serviço de abastecimento d’água teve início; deputado estadual Nilo Coelho; Morais Rêgo, prefeito do Recife; engenheiro Antônio Figueiredo, diretor do DSE e responsável pela realização técnica dos trabalhos; engenheiro João Geraldo, do DSE; além de jornalistas recifenses e outras autoridades.

Diário de Pernambuco em 29/11/1950

O ato inaugural teve lugar a partir das 14 horas, na segunda-feira, 27 de novembro de 1950 no prédio da Estação de Tratamento de Água – ETA Afetos, localizada na Rua Amazonas, s/n, Bairro da Caixa D’Água em Pesqueira.

Na estação de tratamento e distribuição do sistema de abastecimento d’água o governador e comitiva, antes que pudessem visitar as moderníssimas instalações foram recepcionados pelos presentes com uma calorosa salva de palmas enquanto a banda de música tocava o hino de Pernambuco.

Prefeito Ésio Araújo

Na sequência da solenidade, o prefeito Ésio Araújo, em discurso diante da multidão e na presença do governador Barbosa Lima Sobrinho, destacou suas ações à frente da administração para melhorar Pesqueira, com ênfase no abastecimento de água. Reconheceu o empenho do deputado José Domingues e elogiou o papel do governador na conclusão das obras em benefício da cidade.

Também fez uso da palavra o engenheiro João Geraldo da Silva, em nome do engenheiro Antônio Figueiredo, focalizando o trabalho do Departamento de Saneamento do Estado (DSE) na realização do importante melhoramento em Pesqueira.

Alexandre José Barbosa Lima Sobrinho
Governador de Pernambuco (1948/1951).

Encerrando a solenidade, o governador Barbosa Lima Sobrinho ressaltou a atenção de seu governo com as cidades do interior e expressou satisfação por entregar a obra, afirmando ter correspondido à confiança do povo ao ser eleito governador de Pernambuco.

Sobre o serviço executado o engenheiro Antônio Figueiredo (DSE) fez considerações ao repórter do Diário de Pernambuco e que são pertinentes à citação de forma resumida neste artigo. Vejamos:

·   A água captada do riacho Gitó, onde foi construído o açude Afetos com 18 m de altura e capacidade de armazenar 550 mil m³ de água;

·   A adutora inaugurada tinha 5.400 metros de extensão com tubos de 5 e 4 polegadas, podendo fornecer até 1,2 milhão de litros por dia;

·  O sistema de tratamento era moderno e incluía floculação, decantação, filtração e desinfecção por cloro;

·  A estrutura permitia a ampliação para tratar até 3 milhões de litros por dia;

·  Na extremidade da adutora foi instalada uma turbina hidráulica para aproveitar a vazão da água e com capacidade de gerar 3 HP de energia para a iluminação e os equipamentos da estação de tratamento;

·   A rede distribuidora possuía 9.700 metros de extensão com diâmetro de 3 e 8 polegadas, atendendo quase toda a cidade, dividida em duas redes independentes por conta da topografia - zona alta e zona baixa, com reservatórios próprios com capacidades de 200.000 a 600.000 litros, respectivamente. 

As obras do sistema adutor do açude de Afetos custaram 3,4 milhões de cruzeiros e permitiram uma cobertura de distribuição de água numa extensão de quase 10 km indo do bairro do Prado ao bairro da Pitanga passando pela Praça Manoel Caetano de Brito, Avenida Comendador José Didier, ruas Barão de Vila Bela, Zeferino Galvão, 13 de Maio e por tantas outras ruas da cidade que já contava com 80 logradouros, 2.359 habitações e 13.291 habitantes na área urbana conforme os dados do Censo de 1950.

Por si, a inauguração do sistema de abastecimento d’água é um fato de extrema importância para o município. Contudo, o que o torna ainda mais relevante é que ele foi realizado por pessoas. Afinal, quantos operários não derramaram incontáveis gotas de suor no trabalho braçal para que as obras avançassem e beneficiassem toda população pesqueirense.

Sobre os operários não dispusemos de fontes para nominá-los. Entretanto, localizamos a portaria n⁰ 384 de 09/08/1951 através da qual o Diretor Geral do Departamento Estadual de Saneamento nomeava o pessoal para o Serviço de Abastecimento d'água de Pesqueira. Eram eles: Antônio Alves Bezerra – Encarregado da Estação de Filtros; Francisco Soares de Araújo – Encanador; Firmino Torres – Fiscal; Sebastião Eduardo – Ajudante de Encanador; Airton Sampaio Alencar – Ajudante da Casa dos Filtros; Inácio Bezerra – Vigia da Linha Adutora; Januário Teixeira – Vigia do Açude Afetos; Fortunata Maria da Conceição – Encarregada da Torneira do Açude Pedra d’água; Terezinha Rocha Cabral – Encarregada de Cobrança de Consumo; Marieta Francisca Araújo, Sebastiana Assunção Melo, Maria Ester de Freitas, Sebastiana de Souza, Maria de Lourdes Silva e Josefa Freire Araújo  – Guardas de Chafariz.

Essas informações são preciosas, primeiro porque revelam que o sistema de abastecimento era integrado entre os açudes de Pedra D’Água e Afetos; em segundo lugar pelas profissões que existiam à época como as guardas de chafariz, responsáveis por cuidar desta estrutura pública usada para o fornecimento de água a população, principalmente, aqueles que não dispunham de água encanada nas suas residências. E por último, mas, não menos importante por nos permitir nomear pessoas e celebrar memórias. A história é viva porque foi feita por nossa gente, e que em sua maioria a escreveram no anonimato.

            Nestas linhas, objetivamos abordar a trajetória histórica do fornecimento de água em Pesqueira, a partir dos açudes pioneiros de Pedra D’Água e Afetos – localizados no Território Indígena Xukuru do Ororubá – passando em revista o crescimento da cidade e o esforço incansável de diferentes governos em responder as carências do seu povo por aquele que sempre foi a maior necessidade dos municípios nordestinos: o acesso à água – fonte vital para a vida humana e para o desenvolvimento da cidade.

Açude Pedra D’Água

Por quarenta anos o açude de Pedra D’Água foi o único a abastecer a cidade sendo símbolo de pioneirismo e da vontade de servir a população pesqueirense de homens públicos da qualidade dos prefeitos Francisco Sinésio, major Cândido de Brito, José de Almeida Maciel e Eliseu Elói Cavalcanti.

Açude Afetos

Afetos, por sua vez, representa a luta política e técnica de uma década de pessoas abnegadas em resolver o problema da falta de água, a exemplo dos prefeitos Arruda Marinho e Ésio Araújo, tornando-se insígnia da modernização e da quebra de barreiras antigas impostas pela falta d'água e o aumento da população. A sua instalação transformou Pesqueira num centro urbano muito mais organizado, assim permitindo que a cidade enfrentasse de forma mais eficiente os períodos de seca e impulsionando seu desenvolvimento econômico, educacional e industrial.

            Em síntese, documentar essa história, com base em fontes originais e dados oficiais dos jornais da época, é reconhecer o valor da memória local e do planejamento governamental. E principalmente, valorizar as vitórias coletivas de uma cidade que, com trabalho duro e muita persistência, transformou a água em ferramenta de cidadania e progresso.

Por Fábio Menino de Oliveira

Referências Bibliográficas

Álbum de Pesqueira administração do Coronel Cândido Cavalcanti de Brito 1923/1925. 

ALMANAK ADMINISTRATIVO, MERCANTIL E INDUSTRIAL DO RIO DE JANEIRO -1891 a 1940- Edição B00067 de 1910, p. 94-95. 

DIÁRIO DA MANHÃ – edições de 11/08/1932; 08/06/1932; 12/01/1935; 11/07/1941; e 05/07/1942. 

DIÁRIO DE PERNAMBUCO – edições de 22/07/1927; 10/4/1932; 04/02/1942; 08/04/1942; 23/12/1943; 18/08/1950; 29/11/1950; 1º/03/1958; 16/04/1958; e 27/07/1967. 

DIÁRIO OFICIAL DO ESTADO – edições de 09/04/1940; 26/11/1940; 27/11/1940; 21/05/1941; 11/07/1941; 06/11/1941; 04/02/1942; 12/09/1942; 27/04/1943; 15/12/1943; 20/12/1944; e 18/08/1951. 

IBGE – INSTITUTO BRASILEIRO DE GEOGRAFIA E ESTATÍSTICA. Anuário estatístico do Brasil. Rio de Janeiro: IBGE, 1940. 

JORNAL A PROVÍNCIA – edição de 29/3/1927. 

JORNAL DO RECIFE – edição de 12/07/1931. 

MACIEL, José de Almeida. Ruas de Pesqueira. Apresentação de Gilvan de Almeida Maciel. Recife, CEHM, 1987. 

SETTE, Hilton. Pesqueira- Aspectos de sua Geografia Urbana e de suas Inter-relações Regionais. Tese de Concurso para Provimento de Efetivo da Cadeira de Geografia do Brasil com Colégio Estadual de Pernambuco. Recife: 1956. 

WILSON, Luís. Ararobá, Lendária e Eterna. CEPE/Pref. de Pesqueira. Recife: 1980.

quinta-feira, 22 de maio de 2025

PRAÇA JURANDIR BRITO DE FREITAS: HISTÓRIA E MEMÓRIA

 

Praça Jurandir Brito de Freitas na década de 1970. Acervo Marcelo Nascimento.

Praça da Liberdade

  

            A nomenclatura primitiva deste importante logradouro era Praça ou Pátio da Liberdade, nome dado quando da formação do núcleo de casas e que não tinha relação com a causa abolicionista de acordo com José de Almeida Maciel.

Vista aérea de Pesqueira em 1913. Acervo Marcelo Nascimento.
 
         

            A construção de casas deve ter iniciado no início do século XX, pois ao analisarmos uma fotografia aérea de Pesqueira de 1913, é possível observar do lado direito um muro que seria das casas que ficavam defronte a antiga Rua 15 de Novembro - atual Dr. Lídio Paraíba - do lado esquerdo temos 2 casas e na frente mais outras 3 ou 4 edificações que pela baixa qualidade da imagem não dá para identificar com precisão.

Praça 6 de Março em 1924. Foto Severiano Jatobá Neto

A fotografia de 1924 de Severiano Jatobá Neto corrobora essa informação na medida em que mostra 13 casas do lado esquerdo sendo 6 chalés, e é sobre esse tipo de construção que faz-se mister fazer algumas considerações que nos auxiliam a entender o processo de formação da praça. Os chalés tornaram-se bastante comuns nas fazendas e sítios no final do século XIX. Nos centros urbanos começaram a se tornar populares especialmente nos anos 10 do século XX, assim foi em Recife e também em Pesqueira, por pessoas que queriam dispor dessa arquitetura eclética com estilo afrancesado não só nas fazendas, mas também na cidade.

Outro detalhe importante para inferirmos que as casas da praça datam do inicio do século XX é que provavelmente ainda não tivessem edificações do lado direito, pois a lente precisa de Severiano Jatobá Neto - a quem devemos o conhecimento visual da Pesqueira da década de 1920 - não abriu o ângulo da foto registrando apenas o lado esquerdo e a frente da então Praça 6 de Março.

O nome Praça da Liberdade foi oficializado pelo Conselho Municipal, através da Lei Municipal n⁰ 37 de 4 de janeiro de 1917. A referida lei sancionada pelo prefeito João Luiz Bezerra Cavalcanti teve origem no projeto proposto por José de Almeida Maciel naquela que foi a primeira iniciativa de organizar a cidade em perímetros central, urbano e suburbano dividindo-a em bairros e nomeando ruas que tinham nomenclaturas estranhas a exemplo de Rua da Tábua Lascada (Barão de Cimbres) e Rua do Capim (Deputado Eliseu Elói) só para lembrar as mais conhecidas.

Vale salientar que foram a partir das proposições de José de Almeida Maciel que mais de 70 logradouros pesqueirenses ganharam nomes de pessoas com relevantes serviços prestados a Pesqueira, a Pernambuco e ao Brasil, sem contar nas datas com significados valiosíssimos para o estado e a pátria. E o mais lastimável, é que não há uma única rua com o nome deste grande pesqueirense, algo que merece ser corrigido, pois, a sua memória deve ser sempre reverenciada por tudo que fez pelo seu amado torrão natal. Pesqueira deve muito a Seu Cazuzinha.

De acordo com a Lei n⁰ 37 a Praça da Liberdade fazia parte do perímetro urbano, assim como a Rua 6 de março que ficava entre o largo da Rua 13 de Maio e a Rua 28 de Setembro e ia até o início da antiga Avenida do Progresso – atual Comendador José Didier.

 

Praça 6 de Março

 

Como a Lei nº 37 foi sancionada em janeiro de 1917 e o Centenário da Revolução Pernambucana ocorreu em março do mesmo ano, é considerável que tenha sido mudada o nome da rua para a Praça da Liberdade como homenagem à revolução, uma vez que nessa época figuras revolucionistas célebres como Leão Coroado, Padre Roma, Padre Tenório, Monsenhor Muniz Tavares e Padre João Ribeiro viraram nomes de ruas em Pesqueira e nos distritos.

Apesar de não constar a referência ao fato no importante trabalho Ruas de Pesqueira, é bastante provável que tenha acontecido.  Afinal, se foram nominadas ruas homenageando os revolucionários de 1817 para “glorificar os nomes veneráveis dos nossos heróis e mártires, de eterna memória” (MACIEL, 1985, p.265). Quanto mais não seria dado destaque ao memorável 6 de março passando o nome a designar a praça, visto que foi a data que marcou o movimento republicano e de liberdade democrática que fez de Pernambuco uma nação independente por 75 dias.

A Praça 6 de Março permaneceu com esta designação até a promulgação da Lei Municipal nº 2 de 26 de abril de 1947 que transferiu a nomenclatura para Praça Jurandir Brito de Freitas, também proposta por José de Almeida Maciel que a época era vereador e cuja justificativa foi a seguinte:

 

“A homenagem póstuma que ora prestamos à memória de Jurandir Brito de Freitas representa o sentir unânime dos seus conterrâneos. Espírito empreendedor e dinâmico, servido por cintilante inteligência, o jovem e pranteado pesqueirense tinha o nome em grande evidência no seu município e além fronteiras. Desapareceu prematura e abruptamente ocasionando profundo abalo no coração pesqueirense e grande vácuo no

progresso local em seus vários setores. Industrial, comerciante, homem público, foi-lhe entregue o bastão de chefe politico, revelando elevado senso de organização comprovado pela pujança, neste município, da organização partidária que dirigiu. Político sem ressaibos de facciosismo. espírito harmonizador e democrático, antepunha, acima de tudo, o seu grande amor ao torrão natal. É, pois, da maior justiça o pleito de homenagem que Pesqueira rende ao inesquecível filho apondo o seu nome ilustre em uma das praças desta cidade.”

 

            De acordo com Maciel (1987, p. 68) o nome Praça 6 de Março não caiu nos gostos da população que ainda continuavam a chamar pela designação primitiva de Praça da Liberdade e também por isso achava importante a mudança passando a data da Revolução de 1817 a nomear uma travessa anexa a Praça Jurandir Brito de Freitas ligando-a a Rua Barão de Vila Bela - atualmente chamada de Travessa Emídio Santos.

 

O homenageado

 

Jurandir Brito de Freitas em fotografia do livro
Ararobá, lendária e eterna. 

            Jurandir Brito de Freitas nasceu em Pesqueira no dia 19 de junho de 1912. 4º filho do Cel. Adalberto Cavalcanti de Freitas e Maria Alice Brito de Freitas que também foram pais de Raimundo Teodorico de Freitas, Aracy Brito de Freitas, Moacir Brito de Freitas, Clóvis Brito de Freitas e Maria da Conceição Brito de Freitas. Neto paterno do Dr. Francisco Caraciolo de Freitas e Maria Luzia Cavalcanti de Freitas. Neto materno do capitão Carlos Frederico Xavier de Brito e Maria da Conceição Cavalcanti de Brito.

Casou em Pesqueira no dia 19 de novembro de 1935 com Clarisse Valença de Freitas (1912-1994), filha de Desidério Alves da Silva Valença e Galiana Hermínia Teixeira Vilela. Foram pais de Lucília Maria, Fausto, Luciano, Helena Maria e Cecília Maria Valença de Freitas.

Industrial, membro da Associação Comercial de Pesqueira, chefe da Companhia Comercial J. Freitas pertencente ao grupo de empresas da Fábrica Peixe e responsável pela Agência Ford em Pesqueira que funcionou entre 1946 e 1965 na Rua 13 de Maio no prédio onde atualmente é o INSS, mudando-se para o conhecido prédio da Ford onde atualmente funciona a Secretaria de Inovação Social e Cidadania.

Além da vocação para os negócios herdada dos seus avós e tios que foram os pioneiros na industrialização de Pesqueira. Jurandir tinha outra grande paixão: a política. Possuía o dom da comunicação popular, capacidade realizadora e espírito de iniciativa que lhe garantiram a admiração da sociedade pesqueirense e que certamente, não fosse o fato de ter falecido tão jovem teria sido eleito para ocupar relevantes funções públicas.

Faleceu com apenas 35 anos de idade às 13h do dia 19 de outubro de 1947 na residência dos seus pais localizada na Rua da Hora, n⁰ 409, Bairro do Espinheiro, Recife. Seu sepultamento foi no dia seguinte na sua amada Pesqueira. Conta-nos Luís Wilson (1980, p. 212) que "foi sepultado na sua 'cidadezinha', onde jamais se viu, talvez até hoje, maior consagração póstuma a nenhum outro de seus filhos".

 

A inauguração

 

O Secretário Fausto Freitas discursando ladeado pelo Prefeito José Walderique Tenório.
Cortesia Sandra Tenório "in memoriam".

Dada à homenagem, chegou a ser lançada a pedra fundamental para a construção e urbanização da Praça Jurandir Brito de Freitas, no entanto, fora sendo protelada ao longo dos anos. O prefeito Manoel Tenório de Brito em 1968 instalou novas luminárias a vapor de mercúrio o que melhorou bastante a iluminação. Contudo, foi na administração do prefeito José Walderique Tenório (1973/1977) que praça passou por uma verdadeira transformação.

Em reportagem do Diário de Pernambuco de 27 de outubro de 1973 informa a mudança da feira de frutas que acontecia nas quartas e sábados para a Rua Barão de Cimbres, bem como a retirada das barracas de madeira que serviam de bares e cafés que prejudicavam a estética e a higiene do local para que tivesse inicio as obras de reforma para que fosse feita a urbanização, o ajardinamento e melhorada a iluminação.

Contando com o apoio de Fausto Valença de Freitas - filho do homenageado e então Secretario Assistente do Governo de Pernambuco na gestão de Eraldo Gueiros Leite – Walderique Tenório conseguiu levar adiante um velho sonho dos pesqueirenses que seria ver a praça urbanizada e com o busto de Jurandir Brito de Freitas, que foi feito em bronze pelo artista e escultor Corbiniano Lins.

O Diário de Pernambuco de 27/07/1974 destaca: “Pesqueira inaugura hoje me praça pública o busto do líder Jurandir Britto”. Assim, no sábado ao cair da noite teve lugar o ato inaugural onde estiveram presentes diversas autoridades a exemplo do governador Eraldo Gueiros Leite e sua esposa Olga Monteiro Gueiros Leite; o governador eleito José Francisco de Moura Cavalcanti; o engenheiro Armando Cairutas, Secretário de Obras e Serviços Públicos; os deputados federais Lins e Silva e Joaquim Coutinho; e o professor Potyguar Mattos, diretor do Serviço Social Contra o Mocambo que proferiu as seguintes palavras: “Jurandir Brito de Freitas volta às ruas de Pesqueira. Volta de bronze que lhe perpetuará a imagem na terra que sempre amou” (Diário de Pernambuco, ob.cit.).

Além das autoridades supracitadas incluindo vários prefeitos da região prestigiaram o evento. Familiares foram representados pela viúva Clarisse Valença de Freitas e pelos filhos Luciano, Lucília, Helena, Cecília e Fausto Freitas.

Os detalhes da inauguração constam na reportagem do Diário de Pernambuco de 30/07/1974 intitulada: "Pioneiro industrial é homenageado". A solenidade foi precedida por uma celebração religiosa conduzida pelo bispo de Pesqueira, dom Severiano Mariano de Aguiar.

As filhas Lucília, Helena e Cecília foram responsáveis por cortar a fita inaugural da praça, marcando oficialmente o início da cerimônia. Com a praça lotada, o prefeito Walderique Tenório fez uma oração em reverência à memória de Jurandir Brito de Freitas, exaltando sua importância como líder popular e figura marcante na história de Pesqueira.

Em nome dos netos, a jovem Andréa Gueiros de Freitas expressou sua emoção: “Hoje venho a Pesqueira para percorrer os caminhos do meu avô, que não conheci, mas de quem sempre ouvi falar com carinho e respeito. Sei do seu coração, da sua bondade e do amor que dedicava a esta cidade. Ver sua imagem eternizada em bronze é motivo de orgulho e emoção”.

Fausto Valença de Freitas, falando em nome dos filhos, agradeceu à população de Pesqueira. Visivelmente emocionado, citou versos de Cecília Meireles para expressar os sentimentos da família diante da homenagem: “Não tens fala, nem movimento, nem corpo. E eu te reconheço, assim, a mim mesmo, como se me puderes reconhecer”.

Além dos discursos emocionantes o evento tornou-se festivo com a apresentação dos indígenas Xukuru do Ororubá, de bandas de pífanos e de grupos folclóricos para celebrar este grande momento vivenciado pela população pesqueirense que nesse mesmo dia presenciou também a inauguração do novo sistema de abastecimento de água da cidade proveniente da Barragem do Bituri em Belo Jardim.

Praça Jurandir Brito de Freitas - 2025

Por fim, não apenas como ato final da solenidade, mas como celebração perpétua da memória, da história e do legado deste ilustre pesqueirense permanece gravada no pedestal do seu busto a seguinte inscrição: “Homenagem do povo de Pesqueira ao seu filho Jurandyr Britto de Freitas. 27 de julho de 1974”.

 

Por Fábio Menino de Oliveira

Referências Bibliográficas

ÁLBUM DA ADMINISTRAÇÃO DE ÉSIO MAGALHÃES ARAÚJO, 1948-1951. Recife, Oficina Tipográfica do Diário da Manhã, 1951.

DIÁRIO DA MANHÃ- edição de 30/07/1974.

DIÁRIO DE PERNAMBUCO - edições de 20/03/1968; 27/10/1973; 23/07/1974; 27/07/1974; e 30/07/1974.

JORNAL PEQUENO - edição de 20/10/1947.

MACIEL, José de Almeida. Ruas de Pesqueira. Apresentação de Gilvan de Almeida Maciel. Recife, CEHM, 1987.

WILSON, Luís. Ararobá, Lendária e Eterna. CEPE/Pref. de Pesqueira. Recife: 1980.

quinta-feira, 15 de maio de 2025

PRAÇA COMENDADOR JOSÉ DIDIER – MEMÓRIAS DO CORAÇÃO

Praça Comendador José Didier após sua inauguração em 9/11/1951.
Acervo Marcelo Nascimento.

             A antiga estrada da Pitanga que ligava a parte alta da cidade, passando pela parte baixa em direção a Pitanga recebeu o nome de Rua do Progresso dado pelos proprietários da Fábrica Rosa – os irmãos Antônio Didier e José Didier – quando fundaram a fábrica em 1906, este era o nome que constava nos registros das juntas comerciais de Pernambuco e do Rio de Janeiro, passando a chamar Avenida Didier alguns anos depois.

Fábrica Rosa em 1906, localizada na Rua do Progresso,
antiga estrada da Pitanga
.

            De acordo com José de Almeida Maciel em artigos publicados na Gazeta de Pesqueira (08/09/1907) e n’A Voz de Pesqueira (07/09/1947) cita que o nome Rua do Progresso não chegou a ser oficializado pelo Conselho Municipal e fazia a indicação para que a avenida que estava sendo aberta passasse a chamar Avenida Comendador José Didier se contrapondo a solicitação feita a época por moradores dirigidos ao Conselho Municipal que requeria a nomenclatura de Avenida Antônio Didier.

Fábrica Rosa, após 1911, pois vê-se os trilhos do bonde
que era puxado por burros. Acervo Marcelo Nascimento.

            A indicação do então conselheiro municipal José de Almeida Maciel foi feita através de requerimento apreciado na sessão de 10 de março de 1948 pela Conselho Municipal cujo teor foi o seguinte:

 

“Considerando que a denominação "Avenida Didier" dada, desde alguns anos, a uma das artérias desta cidade, justamente aquela em que se localiza a grande fábrica José Didier& Cia. Ltda., não exprime bem, por lacônica, a homenagem prestada a benemérito membro da tradicional família;

Considerando que, consoante à praxe, as homenagens quando expostas em logradouros públicos devem ser individualizadas por isso que identifica o vulto que delas se faz merecedor;

Considerando que o Comendador José Didier foi também um dos pioneiros da grande indústria que, dando renome a Pesqueira, tem sido um dos fatores quiçá o mais preponderante do seu progresso;

Considerando que o saudoso e venerando industrial pesqueirense contribuiu generosamente para todas as obras pias e religiosas desta cidade, inclusive o "Dispensário dos Pobres" que lhe deve assinalados benefícios;

Considerando que, pelo espírito caritativo e pela magnanimidade do coração, atributos estes de grande elevação moral, ficou sendo tido o Comendador José Didier, o conceito público o proclama, como a encarnação da filantropia nesta cidade;

Requeiro seja enviada ao sr. Prefeito a presente indicação no sentido de ser providenciada a retificação das placas da Avenida Didier para Avenida Comendador José Didier, denominação que melhor exprime a homenagem prestada a um dos grandes benfeitores de Pesqueira.”

 

            Decerto é que a indicação foi aceita pelo Conselho Municipal e em entrevista do prefeito Ésio Araújo publicada na Folha de Pesqueira em 23 de janeiro de 1949 é citada o inicio da pavimentação da Avenida Comendador José Didier, cuja área calçada já compreendia 529 m2 com a construção de 200 metros de galerias com tubos de 16 polegadas para o escoamento das águas pluviais.

Fotografia de 1948 antes do início do calçamento e da praça, pois o terreno em frente a Fábrica Rosa ainda está sem o meio-fio e o calçamento.

          No orçamento de 1948 constava um investimento de Cr$ 42.834,90 para o calçamento de 5.292 m2 da Avenida Comendador José Didier e no ano de 1949 o valor foi de Cr$ 73.067,30 para a continuidade da obra numa extensão de 2.206 m2. Com isso temos o valor global de Cr$ 115.902,20 para o calçamento de 7.498 m2 em razão da grande extensão da avenida.

Fotografia provavelmente de 1948 quando foi colocado o meio-fio para ser feito o calçamento. Acervo Marcelo Nascimento.

          A abertura e a pavimentação da avenida faziam parte do planejamento do prefeito Ésio Araújo para melhorar as condições urbanísticas do município que estava em pleno desenvolvimento. Por conta disso e em continuidade dos serviços a prefeitura deu inicio em 1951 a construção da Praça Comendador José Didier com um investimento previsto de Cr$ 94.869,80.

            A praça foi construída num espaço amplo, onde foram plantadas as tradicionais castanholas que se tornariam árvores frondosas. Muito utilizadas no paisagismo urbano por oferecerem sombra e beleza, além de serem resistentes ao clima tropical e que contribuíam para conforto térmico e a estética do local.

Fotografia da construção da Praça em fase de conclusão - 1951.
Álbum Ésio Araújo.


        Para compor um cenário harmônico e acolhedor da praça, foi construído um tanque para o espelho d’água, um playground para o lazer e a brincadeira das crianças e colocado um busto com 80 cm do Comendador José Didier, esculpido em bronze pelo professor Bibiano Silva que foi posto num pedestal de granito medindo 2 metros e que custou Cr$ 40.000,00 tendo sido ofertado à prefeitura pela viúva D. Maria Alfina Didier, um gesto de agradecimento pela iniciativa da edilidade em homenagear seu amabilíssimo e saudoso esposo.

Busto do Comendador José Didier.


        A atraente e aprazível Praça Comendador José Didier – também conhecida por Praça da Rosa – foi inaugurada em 9 de novembro de 1951, data do 92º aniversário de D. Maroca Didier e seis dias antes do encerramento do mandato do prefeito Ésio Araújo que realizou uma das gestões mais exitosas da história de Pesqueira.

À esquerda vemos a placa frontal com a data da inauguração e à direita a placa que fica nas costas do monumento com o registro do 92⁰ aniversário de D. Maroca Didier.


            Encravada no coração de Pesqueira, a Praça Comendador José Didier, é espaço de sombra, flor e memória. Por esse motivo o rabiscador dessas linhas que não teve o privilégio de contemplá-la nos seus tempos áureos ousa escrever sobre cinco características que marcaram a memória de muitos pesqueirenses: as castanholas, as papoulas, os pergolados, os bancos e o tanque espelho d’água.

Fotografia provavelmente da década de 1960, pois não se observa modificações na estética original da Praça.


        Sob o balançar sereno das castanholas, que se erguem como guardiãs do tempo com suas copas largas e acolhedoras, a praça abriga histórias sussurradas pelo vento. Suas folhas, que no outono tingem o chão de vermelho e ouro, desenham um tapete natural onde os passos dos antigos moradores ainda ecoam.

Entre os caminhos de pedra, despontavam delicadas papoulas, com suas pétalas leves e vibrantes. Pequenas centelhas de cor em meio ao verde, flores que parecem sorrisos da terra, nascidos para enfeitar os dias e perfumar as lembranças. Em sua simplicidade, carregam a beleza da vida que resiste — suave, mas presente.

Neste ângulo vemos o busto em meio às árvores e a sua esquerda o pergolado coberto pelas trepadeiras, fazendo sombra aos bancos. Cortesia de Erika Gonçalves.

E ali, como um convite ao repouso e à contemplação, erguiam-se os pergolados, estrutura leve entrelaçada por trepadeiras como as buganvílias e a alegria das suas cores que davam ares de beleza tropical e porque não dizer de charme e romantismo à Praça. Suas colunas sustentavam não apenas a sombra, mas também as conversas longas, os olhares perdidos no tempo, os sonhos utópicos e o silêncio confortável dos encontros antigos.

Espalhados sob a sombra das árvores e ao longo dos caminhos repousavam os bancos, silenciosos confidentes de tantas histórias. Foram testemunhas do cotidiano, visto que neles, senhores cochilaram, crianças tomaram sorvete, pais assistiram seus filhos brincarem livres, namorados dividiram silêncios e senhoras bordaram lembranças.

Aspecto do tanque espelho d'água tendo ao fundo a Vila Operária da Fábrica Rosa, provavelmente na década de 1960.

Ao centro, o tanque onde descansava mais que um espelho d’água, era um verdadeiro espelho do céu, pois um dia refletiu rostos, luas e brincadeiras de criança. A sua presença era símbolo de um tempo charmoso em que o encontro era rotina e a praça, um palco de afetos cotidianos.

Muito do que foi à Praça Comendador José Didier ficou gravado apenas na memória e nos registros fotográficos, por isso o uso de muitos verbos no passado, já não existem o tanque, os pergolados e os bancos. Por isso, nos fica o sentimento de saudades daquilo que não vivemos e de um tempo em que se respeitava o ritmo da vida que passava devagar sem a pressa da modernidade.

Em síntese, juntos, esses elementos compunham mais do que um espaço urbano — eram a alma viva da cidade e que construíram memórias afetivas de uma Pesqueira que pulsava em cada sombra, flor e no silêncio d’água presentes na bela e acolhedora Praça Comendador José Didier que evoca memórias do coração.

 

Por Fábio Menino de Oliveira

 

Referências Bibliográficas

ÁLBUM DA ADMINISTRAÇÃO DE ÉSIO MAGALHÃES ARAÚJO, 1948-1951. Recife, Oficina Tipográfica do Diário da Manhã, 1951.

FOLHA DE PESQUEIRA. Ano II, Nº XII, Pesqueira/PE, 23/01/1949.

MACIEL, José de Almeida. Ruas de Pesqueira. Apresentação de Gilvan de Almeida Maciel. Recife, CEHM, 1987.