domingo, 27 de julho de 2025

PEDRAS E PROGRESSO: O CALÇAMENTO DO CENTRO DE PESQUEIRA

 

Praça D. José Lopes com o parque instalado para a Festa de Santa Águeda em 1941.
Nota-se a praça com o meio-fio e parte da calçada construída, obra iniciada em junho
de 1940. Acervo Marcelo Nascimento. 


Em 1º de agosto de 1939 quando o bacharel João Arruda Marinho dos Santos foi nomeado pelo interventor Agamenon Magalhães para assumir a prefeitura de Pesqueira o panorama da cidade do ponto de vista urbanístico revelava uma urbes sem melhoramentos como o saneamento básico e a pavimentação por paralelepípedos. O que destoava completamente do desenvolvimento econômico do mesmo período por ser uma cidade industrial e comercial.

Até o princípio de 1940, Pesqueira contava com uma única rua calçada - a antiga Praça João Pessoa atual Praça Comendador Manoel Caetano de Brito. A referida rua que dá acesso à Estação Ferroviária foi pavimentada em fins de 1925, pelo prefeito Cândido de Brito que também realizou a quebra de pedras que formavam um rochedo que descaracterizava a atual Praça D. José Lopes com vistas a fazer melhoramentos futuros.

Depois de um período de 15 anos sem nenhum calçamento feito, o prefeito Arruda Marinho iniciou em 1940 a pavimentação em paralelepípedos rejuntados com cimento da Praça Marquês do Herval atual Praça Getúlio Vargas com extensão de 1.892 metros quadrados concluídos em outubro de 1940.

Inauguração da Praça D. José Lopes em 09/09/1941.

Em telegrama enviado ao Interventor Federal de Pernambuco publicado no Diário da Manhã em 03/07/1940 o prefeito comunica o início das obras de calçamento da Praça Dom José Lopes numa extensão 2.760 metros quadrados. Em dezembro de 1940 começa a implantação dos jardins. Também fizeram parte das obras o saneamento básico com a construção de galerias pluviais e esgotos de alvenaria. Os melhoramentos da Praça Dom José Lopes foram inaugurados em 9 de setembro de 1941.

Ainda em 1941 foi feito o aterro, a terraplanagem e o assentamento de 1.076 metros de meio-fio da antiga Avenida Cleto Campelo até o Jóquei Clube - atual Praça Joaquim Mota Valença no Bairro do Prado. Um adendo é que Avenida Cleto Campelo compreendia o trecho que atualmente encontra-se dividido entre as Avenidas Dr. Joaquim de Brito e F. Pessoa de Queirós até o Hospital Dr. Lídio Paraíba, em cuja frente também foram realizados serviços de nivelamento do terreno que permitiram o ajardinamento do espaço iniciado em março de 1943.

Dando sequência aos melhoramentos no centro da urbes, o prefeito Arruda Marinho executou o calçamento da Avenida Carlos de Brito em frente à Fábrica Peixe, concluído em abril de 1942 numa extensão de 1.965 m² tendo a prefeitura recebido das firmas Carlos de Brito e José Araújo a doação de 220 sacos de cimento para auxiliar na realização das obras de pavimentação. 

Vale salientar, que a segunda parte da avenida foi inaugurada em 15 de novembro de 1956 na gestão do prefeito Manoel Tenório de Brito com mais 3.256 metros quadrados, e também foram concluídos os 1.743 metros quadrados de calçamento da Avenida Dr. Joaquim de Brito até o Hospital Dr. Lídio Paraíba. Bem como, em março de 1958 foi concluído o calçamento no entorno da Praça Jurandir de Brito.

Com relação à Rua Barão de Vila Bela, outra importante artéria do centro da cidade por ter sido desde sempre uma artéria comercial, não dispomos de maiores informações para definir o período em que foi calçada. Todavia, de acordo com Cavalcanti (2005, p. 136) a mesma foi pavimentada durante a gestão de Arruda Marinho. Corrobora essa informação uma matéria divulgada pelo Diário de Pernambuco em 14/03/1953 onde ocorre uma cobrança para que se execute calçamentos nas artérias do centro e cita nominalmente as Ruas Zeferino Galvão, 6 de Março, Maestro Tomás de Aquino e Barão de Cimbres, e as Avenidas Carlos de Brito e Dr. Joaquim de Brito.

Outro dado importante é o requerimento n⁰ 21 de 2 de junho de 1948, no qual o vereador José de Almeida Maciel cobra ao prefeito Ésio Araújo a continuidade dos serviços de calçamento da Avenida Comendador José Didier e da Rua Maestro Tomás de Aquino cujas obras de assentamento de meio-fio tiveram início em agosto de 1947 na gestão do prefeito Laércio Valença. 

Em outro requerimento de n⁰ 16 apresentado na sessão de 13 de maio de 1948, o vereador José de Almeida Maciel cita que a única artéria sem calçamento no perímetro central era a travessa do sobrado dos herdeiros de Domingos Cruz e o prédio da Farmácia São José que ligava a Praça D. José à Rua Maestro Tomás de Aquino, além disso, propõe a mudança de Beco Domingos Cruz para a Travessa São José.

Com isso, todas as informações disponíveis nos leva a crer que a Rua Barão de Vila Bela foi calçada pelo prefeito Arruda Marinho, visto que administrou Pesqueira até 1946 e que pode realizar os melhoramentos urbanos graças ao seu trabalho e empenho de gestor eficiente, só para termos uma ideia ele aumentou a arrecadação municipal de 400 contos de réis em 1940 para 750 contos em 1941 que deram lastro financeiro para o saneamento e a pavimentação.

Cabe registrar a colaboração efetiva dos auxiliares do prefeito: Maria do Carmo Magalhães de Freitas Melo - secretária da prefeitura e que chegou a assumir o mandato em duas oportunidades que Arruda Marinho se afastou; Severino Melo - escriturário da Despesa; Ruiter Figueiredo Matos - escriturário da Receita; e Eugênio Chacon - secretário de obras que entre outras ações foi o desenhista da Praça Dom José Lopes e responsável pela execução da obra.

Vista panorâmica da Praça D. José Lopes e das Ruas Duque de Caxias e
Cardeal Arcoverde, fotografia de 1943 ou 1944.Cortesia de Francisco Neves.

Fechando o perímetro urbano central de Pesqueira temos as históricas Ruas Duque de Caxias e Cardeal Arcoverde. A primeira consta como uma das artérias mais antigas da cidade remontando à época do Império e que fora dividida para homenagear D. Joaquim Arcoverde, o 1º Cardeal da América Latina, natural da Fazenda Fundão do então município de Cimbres. O padre Joaquim Arcoverde quando foi vigário em Cimbres no ano de 1879 hospedava-se no sobrado pertencente a suas irmãs ao lado da Câmara de Vereadores e que seria em tempos depois a sede da Gazeta de Pesqueira, do Colégio Diocesano Cardeal Arcoverde, da Ação Católica e da Associação Comercial de Pesqueira.

Tendo o cardeal falecido em 18 de abril de 1930, segundo nos conta José de Almeida Maciel (1987, p.114) o deputado federal Solidônio Leite, líder da bancada pernambucana, telegrafou para o município informando do ocorrido e na sequência o Conselho Municipal se reuniu para prestar homenagens  e uma delas foi dividir a Rua Duque de Caxias - a partir da atual Travessa Vereador Libério França - para dar a denominação de Rua Cardeal Arcoverde no trecho em que se formou o núcleo primitivo de Pesqueira e dela fazem parte as históricas construções da Capela de Nossa Senhora Mãe dos Homens, o Palácio Episcopal, o Solar dos Maciéis, a Câmara de Vereadores, os Correios e Telégrafos, a Escola Cacilda Almeida e o Pólo da UFRPE/UAB - que em outras épocas foram a Usina Elétrica Municipal e a sede da Prefeitura.

Aspecto do calçamento da Rua Duque de Caxias em 1945 ou 1946.
Vê-se o Cinema Moderno com funcionamento a partir de 1938.
Acervo Marcelo Nascimento.

O calçamento em paralelepípedos rejuntados de cimento das Ruas Duque de Caxias e Cardeal Arcoverde teve início em fins de 1942 ou início de 1943. De acordo com telegrama do prefeito para o interventor Agamenon Magalhães publicado no Diário de Pernambuco de 27/03/1943 consta a seguinte mensagem: “Tenho satisfação de comunicar vossência esta prefeitura iniciou construção Jardim Hospital Regional e está concluindo calçamento da Rua Cardeal Arcoverde.” A pavimentação em tela incluía a travessa ao lado da Capela Mãe dos Homens, atual Rua Vereador Libério França.

Ruas Duque de Caxias e Cardeal Arcoverde em 07/09/1948.
Cortesia de Francisco Neves.

O domingo dia 15 de agosto de 1943 registrou um dia festivo para a cidade de Pesqueira com a inauguração do calçamento das Ruas Duque de Caxias e Cardeal Arcoverde. Às 9h30 houve a concentração das escolas municipais, estaduais e particulares, a exemplo do Colégio Santa Dorotéia, Ginásio Cristo Rei, Grupo Escolar Rui Barbosa e Escola Maria Brito; a Tropa de Escoteiros Pio X; o Círculo Operário Católico; a Banda de Música 11 de Setembro; e a população em geral para recepcionar às autoridades.

Estiveram em Pesqueira representando o interventor Agamenon Magalhães, o Dr. José do Rego Maciel, secretário da Fazenda - pesqueirense, filho de Frederico Alves do Rego Maciel e de Maria Eulália Falcão Maciel e pai de Marco Maciel; o Dr. Nilo Pereira, diretor do Departamento de Imprensa e Propaganda (DEIP); e outras pessoas que integravam a comitiva do governo estadual.

Ruas Duque de Caxias e Cardeal Arcoverde em 1958. Destaque para o poste no canteiro central
com o cartaz do filme Prisioneiros Diabólicos lançado no Brasil em 1958. Acervo Marcelo Nascimento.

O ato inaugural da pavimentação das Ruas Duque de Caxias e Cardeal Arcoverde teve lugar a partir das 10h com a chegada dos representantes do interventor em que foram recepcionados com a saudação do prefeito Arruda Marinho.

Vale destacar que neste mesmo dia tiveram outras atividades como a visita às escolas, ao Hospital Regional e o Dispensário dos Pobres; além da inauguração no prédio da Cooperativa Agropecuária no qual se realizou a Exposição das Realizações do Estado Novo em Pernambuco e na qual discursou o prefeito e o Dr. Miguel Braz, juiz de Direito da Comarca.

Praça D. José Lopes com as Ruas Duque de Caxias e Cardeal Arcoverde ao fundo
em 1959 ou 1960. Destaque para as árvores plantadas no canteiro central que não 
aparecem na foto de 1958 e para o Jeep ao lado esquerdo da praça e que foi lançado
no Brasil em 1957. Acervo Marcelo Nascimento.

As Ruas Duque de Caxias e Cardeal Arcoverde formam uma reta com calçamento largo se estendendo a partir da Praça D. José Lopes. A área central possuía cinco canteiros centrais retangulares elevados dispostos em sequência, criando uma divisão visual organizada e pequenos postes de iluminação pública.

Compunha a estética das ruas recém pavimentadas a simetria das árvores que as ladeavam de forma alinhada criando um corredor urbano arborizado que levava o olhar até o horizonte para contemplar a beleza do casario antigo e histórico que concentravam o comércio e a vida urbana da cidade. 

A configuração do conjunto formado pelas Praças Getúlio Vargas e Dom José Lopes juntamente com as Ruas Duque de Caxias e Cardeal Arcoverde pavimentadas entre 1940 e 1943 transmitia a ideia de planejamento urbano formal, com forte inspiração nos princípios de ordem, eixo central e repetição modular — elementos comuns em projetos de urbanização do início do século XX.

E foram possíveis graças aos investimentos realizados por Arruda Marinho demonstrando o cuidado, o zelo e boa vontade da sua administração para com Pesqueira ao longo dos quase 6 anos de mandato, por suas ações se tornou merecedor da gratidão dos pesqueirenses que o ajudaram a se eleger deputado estadual em duas legislaturas.

Ruas Duque de Caxias e Cardeal Arcoverde na década de 1960. Detalhe para o tamanho das
árvores no canteiro central e de um novo prédio no lugar do antigo Cinema Ideal cuja demolição
data do inicio dos anos 1960. Cortesia de Francisco Neves.

Os melhoramentos urbanos continuaram a partir de 1947, primeiro com o prefeito Laércio Valença que na primeira vez que administrou a cidade no curto espaço de três meses deu início a colocação de meio-fio na Rua Maestro Tomás de Aquino e Avenida Comendador José Didier, cujo calçamento se deu na gestão de Ésio Araújo juntamente com o Largo Bernardo Vieira de Melo entre 1949 e 1951 até chegar à Praça Comendador Manoel Caetano de Brito.

Em 1950,  Ésio Araújo, também realizou o calçamento da Rua 15 de Novembro atual Dr. Lídio Paraíba com 1.440 metros quadrados de extensão, sendo feita a abertura de uma transversal ligando esta rua à Praça Jurandir de Brito com a indenização e demolição do prédio nº 57 de propriedade de Firmino de Carvalho - atual Travessa Monsenhor Rolim.

No mesmo ano foi feito o nivelamento do terreno entre o Parque Anísio Galvão e a Avenida Comendador José Didier que possuía um grande aterro da linha férrea preparando a rua em frente ao parque para ser calçada, o que aconteceu a partir de junho de 1952, já na volta a prefeitura de Laércio Valença, que também deu início a pavimentação da Rua Barão de Cimbres em janeiro de 1953.

Porquanto, é importante salientar que com a saída de Arruda Marinho e após alguns prefeitos terem sido nomeados e governado por pouco tempo. Ao voltar à normalidade democrática com a eleição em 1947 de Ésio Araújo, em 1951 de Laércio Valença e em 1955 de Manoel Tenório de Brito, ambos tiveram mais tempo à frente da administração municipal e com isso oportunidades de continuar a executar melhoramentos urbanos na cidade, o que de fato fizeram. E assim, no período das décadas de 1940 e 1950, Pesqueira experimentou grande desenvolvimento na pavimentação e no saneamento que mudaram a sua estética urbana. 

Prefeito Arruda Marinho

O idealizador e executor destas mudanças foi o bacharel João Arruda Marinho dos Santos que foi capaz de dar os primeiros passos no caminho de modernizar a urbes, primeiro como prefeito e depois como deputado estadual e secretário do governo de Pernambuco auxiliando os prefeitos que lhe sucederam. Nas palavras de José de Almeida Maciel (1987, p.233), Arruda Marinho como prefeito de Pesqueira “transformou a feição estética da cidade, levando a efeito calçamentos e jardins públicos, resultando a grande movimentação que hoje se nota principalmente no logradouro central.”

Pois bem, ao calçar as Praças Dom José Lopes e Getúlio Vargas; a Avenida Carlos de Brito (1ª parte); e as Ruas Cardeal Arcoverde, Duque de Caxias e Barão de Vila Bela. O prefeito Arruda Marinho, mais do que fixar pedras no chão do centro da cidade, plantou o progresso e o desenvolvimento de Pesqueira, trazendo qualidade de vida à população e valorizando a beleza do casario antigo realçado com o toque da modernidade, deixando claro que não precisa destruir o passado, ele dialoga e tem sintonia com o presente, basta que abramos os olhos para enxergar - e com isso evitar que a memória se perca, pois uma cidade sem memória, torna-se indubitavelmente, em um lugar sem história.

 

Por Fábio Menino de Oliveira


Referências Bibliográficas

DIÁRIO DA MANHÃ - edições de 09/03/1940; 31/03/1940; 03/07/1940; 26/09/1940; 24/10/1940; 03/07/1941; e 05/05/1942. 

DIÁRIO DE PERNAMBUCO - edições de 23/10/1941; 08/11/1941; 27/03/1943; e 23/07/1943. 

DIÁRIO OFICIAL DO ESTADO - edições de 16/04/1941; e 08/04/1942. 

JORNAL DO RECIFE - edição de 12/07/1931. 

JORNAL PEQUENO - edição de 14/08/1943. 

MACIEL, José de Almeida. Ruas de Pesqueira. Apresentação de Gilvan de Almeida Maciel. Recife, CEHM, 1987. 

PESQUEIRA (PE). Álbum da Administração Ésio Magalhães Araújo: Município de Pesqueira – 1948 a 1951. Pesqueira: Prefeitura Municipal, 1951.

quinta-feira, 17 de julho de 2025

ANÍSIO GALVÃO: ENTRE A REDAÇÃO E A TRIBUNA

 

Quadro de Anísio Galvão. Acervo da Câmara de Vereadores.

A infância e a família

 

O pesqueirense Anísio Cordeiro Galvão foi daquelas raras pessoas com o dom da palavra escrita e falada, se nas letras era brilhante, na oratória era magistral. Nasceu na Fazenda Cacimbão no município de Pesqueira em 4 de novembro de 1889, filho de Zeferino Cândido Galvão Filho e Arminda Cordeiro da Fonseca.

Em 1900 estudou na escola pública primária do professor João Camilo Cordeiro Valença que funcionava na Rua Cardeal Arcoverde em frente ao sobrado onde funcionou a partir de 1925 o Colégio Diocesano fundado por D. José Lopes. Na mesma escola em que foi aluno, tornou-se professor em 1907 e entre seus alunos destacamos José de Araújo e Albuquerque Filho, diretor-presidente das Casas José Araújo; e Gumercindo Saraiva de Siqueira Duque, tabelião público em Pesqueira.

Em Pesqueira além de professor exerceu os cargos de Promotor Público interino no período de 5 de novembro de 1911 a 2 de janeiro de 1912. Foi nomeado em 24 de março de 1916 como Adjunto do Promotor Público que na época era o Dr. José Neves Filho, cargo que exerceu até 5 de dezembro de 1917.

Anísio e Lourdes. Foto Revista de Pernambuco - 1926.

Casou em Recife no dia 23 de setembro de 1926 com Lourdes Leal de Barros, filha de Archimedes Leal de Barros (funcionário da administração dos Correios em Recife) e Adalgisa Leal de Barros foram seus padrinhos no civil o Coronel José Pessoa de Queiroz e sua esposa Tereza Cordeiro de Queirós e no religioso o deputado federal Dr. F. Pessoa de Queirós e sua esposa Maria Leontina Jouvin de Queirós. O matrimônio religioso foi assistido pelo cônego Henrique Xavier.

Anísio e Lourdes residiam na Avenida João de Barros, n⁰ 354, no Bairro do Espinheiro, em Recife. Não tiveram filhos.

 

O jornalista

 

Fundou em 1900 o jornal O SERRANO junto com o irmão Alípio Galvão e os amigos Glicério Maciel, Elpídio Maciel, Aristides Bezerra Cavalcanti, Osório Araújo e Pompeu Augusto dos Santos - jovens estudantes entre 11 e 13 anos de idade. O primeiro jornal pesqueirense tinha 4 páginas manuscritas em folhas de papel pautado vendido por 60 réis onde divulgavam notícias, troças, desenhos e exercícios escolares.

Em abril de 1906 assumiu o cargo de revisor do jornal a Gazeta de Pesqueira, cujo proprietário passou a ser seu pai Zeferino Galvão que substituiu o fundador Sebastião Cavalcanti que se mudou para Recife. Passando a exercer a função de redator-secretário a partir de fevereiro de 1908 até o encerramento da 1ª fase do jornal em 28/8/1921.

Os sonhos e os ideais de vencer na vida e progredir no jornalismo, somados às questões políticas locais que tornaram a permanência na sua terra querida difícil, o levaram até o Recife nos idos de 1918, trabalhou inicialmente como repórter e revisor no Diário de Pernambuco. Com a fundação do Jornal do Commercio em 03/04/1919 de propriedade de João Pessoa de Queirós mudou para a redação do novo matutino recifense onde foi repórter e em abril de 1923 passou a integrar o quadro de redatores onde permaneceu até a morte. 

Por sua capacidade de escrever sobre temas como política, economia, direito constitucional e administração tornou-se um dos grandes jornalistas pernambucanos sendo na capital do estado colaborador de diversos periódicos, a exemplo de O Jornal e no Olinda Jornal. 

Destacou-se também nos magazines literários como A Revista de Pernambuco, A Mauricea, A Nota, O Mez, A Rua Nova, A Pilhéria, Revista do Norte, Revista da Cidade e a Revista Alvorada. Na Paraíba, a Revista Era Nova divulgava seus textos literários. No Rio de Janeiro atuou no semanário ABC e nas revistas Brasil Social e Brasil Contemporâneo.

No Recife, além do ofício de jornalista, Anísio Galvão foi funcionário público da Fazenda Nacional tendo sido nomeado em 15/02/1921 para o cargo de escrivão da 1ª coletoria federal de São José, inaugurada em 12/03/1921. 

 

O intelectual 

 

Foto da Revista Brasil Social (RJ) - 1925.

Viajou para a Europa a bordo do vapor Flandria em 18 de janeiro de 1925 para tratar da sua saúde, chegou em Lisboa (Portugal) no dia 29 de janeiro de 1925, depois foi para Paris (França) e Monte Carlo (Mônaco), retornou ao Recife a bordo do Orania em 11 de abril de 1925.

Durante sua viagem escreveu seu único livro intitulado Vida que Corre, lançado em 1925 pelas oficinas gráficas da Empresa Gráfica Editora, Paulo Pongetti & Cia do Rio de Janeiro e dentre as suas crônicas lemos a belíssima “Cidade Serrana”. 


“… “A minha terra tem um cruzeiro no topo da serra.

A minha terra tem um convento no Alto do Prado.

A minha terra tem fábricas, uvas e rosas.

A minha terra tem uma casa onde fui criança. Fica-lhe em frente a Capela de Nossa Senhora Mãe dos Homens, que eu não vejo elegante como hoje é, mas velhinha como naquele tempo em que à noite eu tinha medo de suas janelas, onde me diziam haver almas do outro mundo.

A minha terra tem um sobrado onde meus pais continuaram a ensinar-me, a mim e a meu irmão, o trabalho e o culto à Justiça, à Honradez e à Liberdade.

A minha terra tem, no caminho da Estação, uma casa azul para onde depois nos mudamos e onde havia máquinas de impressão, das quais saíam luz para o povo e amargor para nós”… (Wilson, 1986, p. 59)

 

Mais do que um livro de crônicas de acordo com a crítica especializada do país, de escritores e jornais de países como França, Portugal e Argentina, era uma obra de arte por seu estilo leve, transparente, rítmico e cativante pela intelectualidade e espírito observador de Anísio Galvão. 

Para termos ideia da importância deste livro faz-se mister citar alguns autores que elogiaram e fizeram comentários recomendando a leitura. Foram eles: Blasco Ibáñez - escritor, jornalista e político espanhol; Manuel Gahisto- crítico literário francês; Phileas Lebesgue - poeta, ensaísta e tradutor francês; Fernand Divoire - crítico literário, jornalista e escritor francês; René Maran - escritor e poeta francês nascido na Martinica; Charles Lesca - jornalista e polemista francês; Fernand Divoire - crítico literário, jornalista, poeta e dramaturgo francês; Octave Houdaïle - jornalista, poeta, cronista literário e editor francês; e Sanchez Saez - escritor argentino.

Como escreveu o jornal fluminense Gazeta de Notícias em 12/12/1925: “Assim, a publicação do seu encantador Vida que Corre tem um duplo valor: o de revelar uma forte e completa personalidade de verdadeiro artista, e os pujantes e nobres sentimentos de amor à Pátria.”

Todos os elogios dos críticos literários só confirmam o quanto Anísio Galvão era intelectual e culto. Pois escrevia de forma precisa e com espírito observador e sagaz com comentários leves e cheios de humor. Era poeta de primeira linha, inicialmente da escola do parnasianismo e depois aderindo ao modernismo, deixando crônicas, poesias e prosas espalhadas por jornais e revistas do país, algumas assinadas com as suas iniciais A.G. e tantas outras com o pseudônimo Licarião Selva. 

Como literato venceu um Concurso Literário em 15 de outubro de 1918 promovido pela Revista Leitura Para Todos - magazine mensal ilustrado do Rio de Janeiro e escreveu artigos, ensaios e teses, a saber: Os fatos de Pernambuco em 1922; A rodoviação em Pernambuco (1926); A introdução do café em Pernambuco (1927); e Uma conferência modernista ou o sentido modernista das conferências - palestra realizada na noite de 30/12/1927 no Teatro Carlos Gomes em Natal/RN.

Nas palavras do crítico francês Manuel Gahisto seus escritos eram “d’une sensibilité délicate soutenue par une imagination harmonieuse”, isto é, “de uma sensibilidade delicada sustentada por uma imaginação harmoniosa". Descrevendo Anísio Galvão como um escritor que aliava uma percepção sensível e refinada a uma imaginação equilibrada, criativa, mas contida na harmonia da frase e no domínio da linguagem.

 

O deputado

 

Deputado Anísio Galvão em pé de braços cruzados e apoiado na cadeira
na qual está sentado o governador Sérgio Loreto em viagem à Pesqueira (1925).
Fotografia da Revista de Pernambuco.

Logo que chegou a Recife engajou-se na política tendo participado da fundação do Centro de Imprensa Epitácio Pessoa para propaganda da candidatura do paraibano à presidência da República. 

O seu discurso no comício realizado em 22 de março de 1919 no adro da matriz Santo Antônio na Praça Saldanha Marinho chamou a atenção da plateia em que estava o coronel José Pessoa de Queirós, tendo-o abraçado pelo brilhante discurso e o convidado a fazer parte do jornal que estava fundando, surgindo a partir daí uma amizade entre Anísio Galvão e a família Pessoa de Queirós.

Membro do Partido Republicano foi candidato a Assembleia Legislativa de Pernambuco nas eleições de 15 de janeiro de 1925 sendo eleito com 15.455 votos pelo 3º distrito eleitoral, como o mais votado obteve a seguinte votação nos municípios: Afogados da Ingazeira (657), Águas Belas (358), Alagoa de Baixo - Sertânia (680), Belmonte (377), Bom Conselho (586), Boa Vista (286), Buíque (712), Cabrobó (523), Canhotinho (384), Correntes (318), Exu (433), Flores (498), Floresta (913), Garanhuns (1.480), Granito (482), Ouricuri (777), Parnamirim (512), Pedra (575), Pesqueira (1.746), Petrolina (287), Salgueiro (571), São Bento do Una (370), São José do Egito (421), Serra talhada (603), Triunfo (439) e Tacaratu (407).

Tomou posse em 13 de abril de 1925 como deputado da 12ª legislatura do Congresso Estadual de Pernambuco, que à época tinha 30 deputados que cumpriam mandato de 3 anos, atuou como membro da Comissão de Fazenda e Orçamento, da Comissão de Redação e Leis e da Comissão de Contas e Negócios Municipais.

Deputado Anísio Galvão em pé por trás do padre e a comitiva do governador
Sérgio Loreto que está sentado ao centro. Também está no foto o prefeito
Cândido de Brito, o primeiro sentado da esquerda para a direita.
Revista de Pernambuco em 1925.

A sua primeira viagem a Pesqueira depois de ter tomado posse foi em 11 de maio de 1925. Esteve novamente na sua terra natal como membro da comitiva do governador Dr. Sérgio Loreto e do secretário de Justiça  Dr. Aníbal Fernandes que vieram participar da inauguração do Grupo Escolar Virgínia Loreto e da Escola Municipal Lídio Paraíba em 21 de junho de 1925 construídos pelo estado em parceria com o município sob a administração do prefeito Cândido de Brito.

Foi reeleito nas eleições de 25 de março de 1928 obtendo 16.127 sufrágios, sendo o terceiro mais votado do 3º distrito eleitoral. Assumindo o mandato para a 13ª legislatura foi membro da Comissão de Redação e Leis (presidente) e da Comissão de Fazenda e Orçamento. Em razão do seu falecimento participou apenas da 1ª sessão ordinária no Congresso Estadual, sendo substituído pelo Dr. Bartolomeu Anacleto do Nascimento.

A sua atuação parlamentar foi destacada por sua liderança e conhecimento. Logo no início do mandato foi autor do projeto nº41/1925 que propôs o 1⁰ Congresso de Estradas de Rodagem, Instrução e Saúde Pública de Pernambuco, apresentado na sessão de 12/5/1925 e aprovado em 16/5/1925 do qual foram signatários os deputados João Cleofas, Walfredo Pessoa, Souto Filho, Arruda Falcão, Júlio Bello, Sebastião Lins e Olympio de Menezes. 

O pioneirismo da proposição se dava pelo objetivo de criar um plano rodoviário estadual, uniformizar o sistema de registros de veículos e resolver sobre as taxas de manutenção dos serviços de viação. O evento pioneiro foi realizado no teatro Santa Isabel no Recife de 19 a 26 de janeiro de 1926, tendo Anísio Galvão ocupado a 2ª vice-presidência da Comissão Executiva Organizadora e  Secretário da 2ª Comissão de Conservação das Estradas e Taxas Necessárias ao Serviço Rodoviário.

Presidente Washington Luís discursando na abertura do 4º Congresso
Nacional de Estradas e Rodagens. Fotografia Automóvel Club.

Por sua atuação no congresso estadual foi escolhido pelo governador Dr. Estácio Coimbra para representá-lo no 4⁰ Congresso Nacional de Estradas e Rodagens promovido pelo Automóvel Clube do Brasil e realizado no Rio de Janeiro levando consigo a tese “A Rodoviação em Pernambuco” sobre a situação rodoviária deste estado com 55 páginas divididas em 6 capítulos.

Na abertura do evento em 26 de dezembro de 1926 fez um discurso primoroso e épico na defesa da criação de um caixa nacional para financiar a construção de estradas de rodagem e na expansão da produção de veículos como meio de transporte mais rápido e eficiente por facilitar a comunicação entre o interior e os centros urbanos promovendo o progresso do país.

Congressistas. Fotografia Automóvel Club.

Assim disse o deputado pernambucano: “Brasileiro, há em mim um anseio de que todo o país venha a ser estreitado pelas correntes fortes das vias de comunicação, que, como um fluido vital, hão de animar-lhe as artérias entorpecidas, robustecendo-o e diminuindo as separações que, pela inexistência desse encadeamento, se tornam consideráveis, fazendo com que patrícios, mesmo de um Estado a outro vizinho, permaneçam como estranhos, tal se entre ambos se levantassem pesadas muralhas tártaras” (REVISTA AUTOMÓVEL CLUB - RJ, janeiro de 1927, p. 71).

Presenciaram o pronunciamento do deputado pernambucano, o Dr. Washington Luís Pereira de Sousa, presidente da República, Dr. Victor Konder, ministro da Viação e Obras Públicas, ministros de estado, senadores, deputados e delegados de todos os estados brasileiros. Como reconhecimento pela defesa da sua tese recebeu uma carta do ministro da Viação e Obras Públicas.

 

“Rio, 26 de Julho de 1927. — Prezado amigo sr. Anísio Galvão. Venho de percorrer, com prazer sempre crescente, o opúsculo em que deu forma duradoura ao seu substancioso discurso relativo à rodagem em Pernambuco. Eu, que já o continuava a prezar através dos seus trabalhos puramente literários, não menos rejubilai agora ao vê-lo voltar-se, como representante que é do povo pernambucano, para a solução dos problemas de alcance vital como o da criação de estradas de rodagem, de tanta relevância para Estados essencialmente produtivos qual a formosa região cujas aspirações progressistas encontram intérpretes vigorosos em mentalidades moças e criadoras à feição do meu nobre amigo, herdeiro que é do nome apreciado de Zeferino Galvão, polígrafo que tanto honrou as letras locais. Receba, portanto, os aplausos e os agradecimentos de quem subscreve com estima e considerações sinceras. — Victor Konder.”(Diário de Pernambuco, 07/08/1927)

 

No retorno a Pernambuco, em fevereiro de 1927 apresentou um relatório ao governador com as seguintes propostas: 1) a viabilização de estudos sobre um novo combustível que sucedesse a gasolina a fim de baratear os custos e facilitar o acesso aos veículos a exemplo do álcool; 2) o aumento do uso de caminhões para transporte de cargas; 3) a expansão das estradas para favorecer o turismo; 4) a construção da estrada central no sentido leste e oeste do estado ligando inicialmente o Recife a Rio Branco (Arcoverde) e daí partiria passando por Floresta, Salgueiro, Parnamirim, Ouricuri até os limites do estado do Piauí; 5) a construção da estrada litorânea ligando a parte norte com a já existente estrada de Itambé ao litoral sul passando pelo Cabo, Rio Formoso, Ipojuca, Sirinhaém e Barreiros até chegar a Porto Calvo em Alagoas; e 6) a construção de uma rodovia do norte ao sul do estado ligando Paraíba e Alagoas, partindo de Monteiro passaria por Cimbres, Pesqueira, Alagoinha, Salobro, Garanhuns, Correntes até chegar a Laje do Canhoto (Alagoas).

Podemos perceber o quanto Anísio Galvão foi à frente do seu tempo, nas propostas temos o embrião do que seriam as rodovias BR 232 cortando o estado de leste a oeste e a BR 101 que liga o litoral pernambucano de norte a sul. E por fim, tanto Anísio quanto o pai Zeferino Galvão sempre foram defensores da rodovia Monteiro-Cimbres-Pesqueira cortando a Serra do Ororubá, indo além, fazendo que a mesma contemplasse Alagoinha, Salobro até chegar a Garanhuns, para beneficiar os produtores de leite daquela região e que infelizmente, nunca saiu do papel e olha que já são quase cem anos da proposta de Anísio.

O seu trabalho sobre a rodoviação do estado de Pernambuco foi o grande marco do seu mandato e culminou com a aprovação de uma lei a partir do projeto n⁰1/1927 de sua autoria que criou o Fundo Especial para Estradas e Rodagens no estado de Pernambuco, aprovado pela Assembleia Legislativa em  7 de julho de 1927.

Contudo, não foi apenas na questão rodoviária que ele focou. Também merece destaque as proposições para beneficiar os municípios pernambucanos entre elas podem citar o Projeto n⁰ 26 apresentado em 27/04/1925 autorizando o governador a despender a quantia de 25 contos de réis para melhoramentos nos tanques naturais de Alagoinha, e na sessão de 30/08/1928 apresentou quatro projetos: 1⁰) autoriza o governo do estado a fazer um prédio para escolas reunidas na cidade de Leopoldina (Parnamirim); 2⁰) auxiliar com 50:000$ a conclusão do edifício onde funciona o Colégio Dorotéia na cidade de Pesqueira; 3⁰) construção de pontes sobre o Rio Ipanema no município de Águas Belas e Rio Boa Vista no município de Pedra; e 4⁰) construção de uma estrada de Pesqueira a Villa de Alagoinha.

Como congressista participou também do Congresso do Café realizado em Garanhuns de 11 a 13 de outubro de 1927, alusivo às comemorações do 2⁰ centenário do café em Pernambuco e do 1⁰ Congresso de Crédito Popular e Agrícola de Pernambuco realizado em Recife de 15 a 18 de janeiro de 1928. Com relação a este último congresso atuou como membro da Comissão de Estudo e Elaboração do Plano Tributário de Pernambuco, nomeado pelo governador Dr. Estácio Coimbra em 05/11/1927.

Na tribuna, Anísio Galvão se destacou pelo conhecimento que possuía sobre todos os problemas do estado, seja da economia a política, afinal, isso fazia parte do seu dia a dia como redator de um dos principais jornais pernambucanos. Todavia, não era apenas na máquina de datilografar que o deputado mostrava sua versatilidade e sim, o quanto transformava tudo isso pela oratória.

O ilustre pesqueirense Potyguar Mattos em editorial publicado no Diário de Pernambuco em 4/11/1989 para homenageá-lo pelo seu centenário natalício assim escreveu em letras laureadas sobre a sua oratória: 

 

“Os que o ouviram jamais esqueceram-lhe o domínio da palavra, a magia do verbo, levantando ideias ou conduzindo homens. Infelizmente, sua grande arte morreu com ele. A beleza da eloquência é frágil como o voo do pássaro. Risca o espaço, seduz e encanta, logo se apaga e morre no esquecimento. Mesmo quando se capturam as palavras pela escrita, faltam o orador, o gesto, a voz, a música do instante, feita de emoção, desafios, empaticamente criada pelo que fala  e os que ouvem.”

 

Diante do que foi mencionado, conclui-se que nos poucos mais de 3 anos como deputado estadual, Anísio Galvão deixou sua marca  pela atuação pautada na ética e na defesa de causas pioneiras. A sua inteligência ficou registrada nos anais legislativos e a eloquência ainda ecoa no plenário do Palácio Joaquim Nabuco. 

 

A morte prematura 

 

Único registro do seu sepultamento. Revista O MALHO (RJ) - 1929.

            

        Por três anos Anísio Galvão lutou bravamente contra problemas respiratórios, buscou tratamento na Europa, outras vezes se recolheu em casa ou nas fazendas de amigos, chegou a fazer uma cirurgia no Hospital Português em Recife no mês de julho de 1928.

Sentindo-se pior pelo estágio avançado da tuberculose achou por bem se recolher em uma propriedade no então distrito de Alagoinha, aonde veio a óbito às 18h20 da segunda-feira, 28 de novembro de 1928, sendo sepultado no dia seguinte às 10h no cemitério de Pesqueira.

A morte prematura do homem das letras foi sentida por todos que o admiravam não apenas como intelectual e político, mas como uma pessoa ética, educada e de intangível caráter que soube conquistar ao longo da sua breve passagem aqui na terra muitos amigos. Viveu apenas 39 anos, entretanto, deixou um legado que foi escrito com letras douradas na história de Pesqueira e de Pernambuco.

Os jornais do país repercutiram o seu falecimento enaltecendo a figura como literato, jornalista e político, em nota do seu Jornal do Commercio de 29/11/1928 (apud WILSON, 1986, p.72) sobre a sua atuação como redator disse que o mesmo “deu lustre pela vivacidade de espírito, serenidade de comentários e firmeza de caráter”. O governador Estácio Coimbra enviou telegrama para a viúva, a Câmara dos Deputados, a Assembleia Legislativa, os Conselhos Municipais do Recife, Olinda e Arcoverde aprovaram por unanimidade votos de pesar.

 O Conselho Municipal de Pesqueira se reuniu em sessão especial no dia 25 de novembro de 1928 com a presença de diversas autoridades: “D. José Antônio de Oliveira Lopes (Bispo Diocesano de Pesqueira), Monsenhor Urbano de Carvalho (Diretor do Colégio Diocesano Cardeal Arcoverde), Dr. Arthur Santa Cruz de Oliveira (Juiz de Direito da Comarca), Dr. Zacarias dos Santos (Juiz Municipal), Dr. Rômulo Maia (Promotor Público), Sr. Antônio Soares (Prefeito do Município), Dr. Joaquim de Brito (Subprefeito, representado pelo secretário da Prefeitura) e os Conselheiros José de Almeida Maciel (Presidente da Câmara), Dorgival Galindo (1º Secretário), Eliseu Araújo (2º Secretário), Agostinho Bezerra Cavalcanti, Otávio Bezerra do Rego Barros e Rogério Cavalcanti de Brito.

Os conselheiros municipais aprovaram o seguinte voto de pesar:

 

“Proponho que seja inserido na acta um voto de profundo pesar por motivo do infausto passamento, no dia 19 do corrente, do nosso próximo conterrâneo deputado Anísio Galvão que, com o maior brilho, representava o 3.° distrito do Estado na Câmara dos deputados e que, depois de transmitido, telegramas de condolências do Estado de Pernambuco ao seu eminente e virtuoso extinto, à ilustre redação do Jornal do Commercio” e à contristada família, seja a presente sessão suspensa como homenagem à memoria do ilustre morto.” (A Província, 11/12/1928)

 

            Na mesma sessão, o historiador e conselheiro José de Almeida Maciel fez um discurso épico e emocionante do qual destacamos o trecho:

 

“Todos nós sabemos do extremado amor que ele votava ao torrão natal; todos nós lhe conhecíamos o formoso espírito e a inteligência de escol, o caráter sem jaça e a lealdade que não trastejava; todos nós temos, pois, motivos bastante para chorar-lhe a perda irreparável, nesta nevrose justificável que nos domina, e ter o coração coberto de luto na presente hora de tristeza e de amargura!” (Wilson, 1986, p. 75)

 

            Parafraseando outro mestre das letras pesqueirense, o professor Potyguar Mattos, Anísio Galvão não foi caminhando para a sepultura, neste trajeto foi acompanhado e levado pelos amigos para a integração definitiva com a sua terra, no estranho casamento que ocorre entre o chão e a carne cumprindo o destino de quem voa como a ave nas asas do vento.

 

A inauguração do Parque Anísio Galvão

 

Parque Anísio Galvão, s/d. Acervo Marcelo Nascimento.

Assim que Anísio Galvão faleceu seus amigos envoltos no luto como é possível ver pela sessão do Conselho Municipal se reuniram e organizaram uma comissão composta por José de Almeida Maciel (presidente), José Araújo Filho (tesoureiro), Aristides Bezerra Cavalcanti (secretário), Agostinho Bezerra Cavalcanti (vice-secretário), José Pitta, José Araújo e Albuquerque, Gumercindo Saraiva Duque, Luís Cícero Galvão, José Peixoto Sobrinho, Dorgival de Oliveira Galindo, Otávio Bezerra do Rego Barros, Joel de Holanda Cavalcanti, Paulo de Oliveira, Austriclinio de Oliveira Galindo e Eliseu Araújo. 

O objetivo de acordo com A Província de 11/12/1928 que transcrevia uma nota enviada de Pesqueira em 6 de dezembro do mesmo ano seria o seguinte: “Amigos e admiradores do deputado Anísio Galvão pretendem levar a efeito a construção de um mausoléu, no cemitério desta cidade, onde ficarão depositados os restos mortais do mesmo ilustre conterrâneo.” 

Segundo notícia publicada no Correio de Pesqueira em 15/03/1931 (apud WILSON, 1986, p. 81-82) foram arrecadados em donativos até esta data a quantia de 5:050$000 (cinco contos e cinquenta mil réis). Por este valor ser superior ao necessário para construção do mausoléu a comissão em acordo com a família decidiu construir primeiro um jardim onde seria colocado um busto e receberia o nome de Parque Anísio Galvão.

O local escolhido foi o terreno vizinho ao antigo Grupo Escolar Virgínia Loreto que havia sido inaugurado em 21/06/1925 na descida para a Avenida Comendador José Didier, este trecho que ligava a chamada parte alta da cidade a parte baixa seria calçada muitos anos depois em 1952 na administração do prefeito Laércio Vilela Valença, sendo que seu antecessor Ésio Magalhães Araújo já havia feito à terraplanagem da rua em frente ao parque.

Em 1929 a comissão entrou em acordo com a administração municipal representada pelo prefeito Antônio Arthur de Almeida Soares para construir o parque com os valores recebidos dos donativos e que seriam depois restituídos pela prefeitura para que pudesse ser feito o busto e o mausoléu. Ou seja, foi feito um empréstimo da comissão para a prefeitura no valor total de 4:870$100 (quatro contos e oitocentos e setenta mil e cem réis) quantia esta que foi dividida com a expedição de 10 cheques.

Acontece que com o advento da Revolução de 1930, o prefeito Antônio Soares que assumiu poucos dias depois da morte de Anísio Galvão em 15/11/1928 e que teria mandato até 15/11/1931 foi destituído do cargo em 7 de outubro de 1930, sendo substituído por Eliseu Elói Cavalcanti. Neste ínterim, não houve pagamento do empréstimo por parte da prefeitura nos anos de 1929 e 1930 o que atrasou o pagamento de dívidas como: itens do funeral - 264$550; construção da cova em alvenaria - 44$000; cerimônias religiosas - 171$000;  e a construção da coluna para o busto - 577$000. Assim como, impossibilitou a aquisição do busto e a construção do mausoléu. 

Mesmo com as dificuldades financeiras foi dado início a construção do parque, uma vez que a reportagem de O Jornal - RJ em 10/06/1930 assim escreveu: “Está recebendo arborização o parque Anísio Galvão, desta cidade. Nesse logradouro, que está sendo preparado com grande esmero, vai ser colocado o busto deste pranteado pesqueirense.”  Informação corroborada com a notícia do Correio de Pesqueira acima mencionada, onde já cita a construção da coluna para o monumento em março de 1931. 

Ainda em 1931, a prefeitura liquidou 3 cheques dos 10 que devia a comissão no valor de 743$200 (setecentos e quarenta e três mil e duzentos réis). Em 1932 foram pagos mais 1:000$000 (um conto de réis). Os valores pagos permitiram a conclusão do jardim que já se encontrava pronto em 1933, entretanto, ainda faltava a colocação do busto, pois a quitação do empréstimo ainda não havia sido efetuada.

Alípio Galvão em carta publicada no Diário de Pernambuco em 05/07/1933 após a visita que jornalistas fizeram ao túmulo em razão da Festa do Tomate em 22/06/1933 que não encontraram o monumento erigido explica o porquê do atraso na construção do mausoléu e da aposição do busto no parque: “Os atuais administradores, entre os quais se encontram também amigos do extinto, encontraram o débito em apreço regularmente escriturado, mas devido às condições financeiras do município, conforme alegam, não puderam efetuar a sua liquidação, o que, contudo, vem prometendo fazê-lo o quanto antes.” 

A Prefeitura Municipal de Pesqueira emitiu nota assinada pelo prefeito Eliseu Elói e divulgada no Diário da Manhã em 09/07/1933 esclarecendo que por conta das dificuldades financeiras encontradas com um débito de quase 93 contos de réis e com os pagamentos do funcionalismo público em atraso de 8 a 12 meses, não tinha condições ainda de quitar todo o empréstimo obtido junto à comissão. E que o faria assim que fosse organizando as contas da edilidade e concluía dizendo que tal empréstimo constituía “um caso inédito nos anais da administração pública.”

Parque Anísio Galvão na década de 1930. Livro Anísio Galvão de Luís Wilson (1986).

A inauguração do Parque Anísio Galvão com o respectivo busto ocorreu no domingo 25 de novembro de 1934 a partir das 17 horas. Estiveram presentes o senhor Miguel Mendonça, tesoureiro da prefeitura, representando o prefeito Dr. Severiano Jatobá; o monsenhor Urbano de Carvalho, representando o bispo D. Adalberto Sobral; Cícero Galvão, representando a família; Luiz Coelho, prefeito de Arcoverde acompanhado de Antônio Japiassú e Isaías Lima; Sebastião Gomes da Silva, sargento da brigada; Abílio Maia, diretor do Jornal de Pesqueira; e Austriclinio de Oliveira Galindo, representante da comissão. 

Coube ao monsenhor Urbano de Carvalho fazer o discurso inaugural da solenidade, seguido pela fala da menina Sylvia Maciel Abreu, de José Farias e de Austriclinio Galindo que em nome da comissão agradeceu a presença e a colaboração de todos para que pudesse ter sido construído o empreendimento em homenagem a Anísio Galvão.

Executado o Hino Nacional pela Banda de Música do Centro Musical Pesqueirense e cantado pelas crianças, seguiu-se o discurso do sargento Sebastião Gomes. Todos os oradores foram aplaudidos calorosamente pelos presentes. 

Como ápice da cerimônia assim escreveu o Jornal de Pesqueira em 1º de janeiro de 1934: “O busto de Anísio Galvão, que se achava envolvido pela bandeira nacional, foi descoberto pelo representante do sr. prefeito, ouvindo-se, então, prolongada salva de palmas.”

 

O busto 

 

Nesta fotografia panorâmica de 1948 é possível ver a imponência do busto
de Anísio Galvão erigido no parque.  Fotografia O MALHO (RJ).

As tratativas iniciais para a confecção do busto foram realizadas com o escultor paulista André Costa pelo coronel Antônio Didier que residia em São Paulo e que de acordo com o Correio de Pesqueira em 15/03/1931 (apud WILSON, 1986, p. 82) já havia preparado a maquete em gesso e estava aguardando o valor inicial de um conto de réis para continuar o serviço. 

Tal serviço não foi à frente tendo em vista a questão dos recursos financeiros, como bem disse Alípio Galvão na carta ao Diário de Pernambuco (05/07/1933): “pelo seu preço elevado não pôde ser aceita, tornou-se mister aguardar a remessa de outras, cujos preços fossem razoáveis, pois a comissão dispondo já de limitados recursos pecuniários, necessitava ter ciência primeiramente da quantia exata a ser despendida com o busto”. 

Em abril de 1934 foi contratado pela comissão o jovem Luiz Ferrer, talentoso escultor pernambucano, natural de Vitória de Santo Antão que estudou na Escola Nacional de Belas Artes no Rio de Janeiro e foi um dos mais renomados escultores do país na primeira metade do século XX com obras e monumentos espalhados por vários estados brasileiros.

Estando de férias dos estudos no Recife, onde fez uma exposição, Luiz Ferrer esculpiu o busto do prefeito de Bezerros José Pessoa Souto Maior, e em seguida veio à Pesqueira para acertar a elaboração do busto do seu filho ilustre. Conforme nota do Diário de Pernambuco em 1º/05/1934: “O busto de Anísio Galvão está sendo confeccionado pelo escultor conterrâneo Luiz Ferrer, devendo ser, em breve, inaugurado.”

Luiz Ferrer esculpiu o busto em Recife, assim confirma uma nota do Diário da Manhã em 09/05/1934 (apud MORAIS, 2024, p.112): “Por uma deferência especial e muito atenciosa do escultor, o sr. Luís Ferrer, tivemos a satisfação de uma visita a obra que está confeccionando, nesta cidade, do busto do nosso patrício Anísio Galvão.” O mesmo Diário da Manhã em 20/06/1934 notícia o retorno de Luiz Ferrer para continuar os estudos no Rio de Janeiro: “Em curta permanência neste Estado em gozo de férias regulamentares, o vitorioso escultor teve a oportunidade de confeccionar os bustos do saudoso jornalista Anísio Galvão e do sr. José Pessoa Souto Maior, ambos com grande perfeição”.

Deste modo, o busto de Anísio Galvão foi elaborado entre os meses de maio a junho de 1934. Feito em bronze assentado sobre um pedestal em forma de coluna com base robusta, em forma de prisma quadrangular que se eleva com linhas retas e limpas, onde havia uma placa alusiva ao homenageado, infelizmente, as fotografias conhecidas não nos permitiram identificar o texto. A parte superior do pedestal era decorada com faixas horizontais esculpidas, dando um ar de imponência e elegância ao conjunto. 

A estrutura repousava sobre uma base de seis degraus, que criava um platô elevado, recurso arquitetônico clássico em monumentos cívicos para dar destaque ao busto, tornando-o visível a certa distância. E as fotos raríssimas que temos revelam esta imponência de beleza sem igual para homenagear um dos filhos mais destacados de Pesqueira em toda a sua história.

 

O mausoléu

 

Mausoléu Monumento de Anísio Galvão.
Fotografia Acervo Marcelo Nascimento.

Completando o conjunto de homenagens idealizado pela comissão de amigos e admiradores foi finalizado em 1934 o seu túmulo que tamanha a sua expressividade no cemitério de Pesqueira podemos chamar de o “Mausoléu Monumento de Anísio Galvão”. 

O monumento possui uma estrutura imponente de alvenaria, erguida em forma de obelisco com base mais larga e um topo trabalhado, com detalhes em relevo, sendo um dos mais belos jazigos localizados no cemitério de Pesqueira.

Perto do topo, há um busto em relevo de Anísio Galvão em um nicho semicircular decorado, que o destaca como figura central da homenagem. Abaixo do busto, há uma placa onde se lê: “A ANÍSIO GALVÃO, HOMENAGEM DOS SEUS AMIGOS E ADMIRADORES 1934.”

Inscrição no mausoléu. Fotografia do acervo de Marcelo Nascimento.

Entre os ornamentos presentes para simbolizar a glória e a eternidade do falecido destacamos os adornos esculpidos em alto-relevo de folhas e ramos entrelaçados nas cores verdes musgo para realçá-los ante a pintura branca do túmulo.

Por fim, o estilo do monumento mostra a influência da arte funerária do início do século XX, típica de personalidades de grande importância para sua comunidade. A grandiosidade, o busto e a inscrição indicam respeito e reconhecimento público a Anísio Galvão.

 

A depredação e o desaparecimento

 

Busto em 1950. Fotografia Jornal de Pesqueira - 1989.

            No dia 10 de março de 1958, a população de Pesqueira amanheceu estarrecida com um fato triste e revoltante: a depredação do busto. Conforme escreveu Luiz Neves na sua coluna no Diário de Pernambuco em 15/03/1958: “O fato indignou os habitantes toda a cidade, segunda-feira passada, o busto de Anísio Galvão, homenagem dos pesqueirenses ao seu expoente nas letras, fora destroçado por pedradas, às caladas da noite, uma obra perfeita de vandalismo.” 

            Ao que consta o busto sofreu diversos danos em razão das pedradas e cacetadas pelas mãos de vândalos que num ato de extrema selvageria atentaram contra o monumento que cultuava as letras do município. O assunto repercutiu na cidade e no estado em razão da sua gravidade.

            Os jornais pesqueirenses Era Nova e A Voz de Pesqueira cobriram os fatos com reportagens e editoriais. No domingo 23 de março, o padre José Aragão, diretor da Era Nova (apud Diário de Pernambuco, 27/03/1958), sobre o ato lamentável assim escreveu: “A incapacidade de entender o simbolismo dos bustos é a nítida expressão do abismo que separa o povo educado da gente grotesca e ignóbil. O acontecido com a estátua de Anísio Galvão é um índice tristemente significativo da completa ausência de sensibilidade moral em certas pessoas desta cidade.”

            Por sua vez, o jornalista Rinaldo Jatobá na sua crônica em A Voz de Pesqueira (apud Diário de Pernambuco, 26/03/1958): “Não sabemos mesmo qual o mal, que em vida, praticou Anísio Galvão, aqui. E, no entanto, aí está seu busto, na praça que tem seu nome quebrado como se fosse de um agitador, de um perigoso facínora. Revoltante, brutal, selvagem mesmo foi o ato praticado, naquela madrugada de crepe para as letras pesqueirenses, com o busto do ilustre conterrâneo morto. Qual o filho desta terra não se sentiu ferido com tão entristecedora notícia?”. 

            Na Assembleia Legislativa de Pernambuco, o deputado Júlio de Melo usou da palavra na sessão de 19 de março de 1958 solicitando a mesa que encaminhasse ofício ao Secretário de Segurança Pública  no sentido de ordenar as autoridades policiais de Pesqueira que fizesse diligências com afinco no intuito de descobrir e punir os autores dos atos de vandalismo. As investigações ficaram a cargo do coronel Feliciano Paiva, que ao que consta não logrou êxito no seu intento.

 A Câmara de Vereadores, reunida em 12/03/1958 aprovou o Requerimento nº 7 do vereador Luiz Rocha de repulsa ao atentado e cena de vandalismo praticado contra  o busto do saudoso jornalista Anísio Galvão. Quanto à prefeitura, de imediato mandou fazer os consertos necessários na escultura.

Mesmo reconstruído, o busto não ficou com a sua beleza original e terminou por ter um destino ainda mais melancólico que foi o seu desaparecimento. Os dados disponíveis não nos permitiu precisar a data em que o mesmo sumiu do Parque Anísio Galvão, contudo, através do Requerimento nº 02/79 do vereador Severino Ferreira de Lima apresentado na sessão de 10 de abril de 1979 é possível inferir que o busto já havia sido retirado, pois assim diz o texto:


“Sr. Presidente. Srs. Vereadores: Requeiro à Mesa, depois de ouvido o Plenário, na forma regimental, que se aprove este nosso requerimento, no sentido de fazer reformas nas Praças Comendador José Didier e Anísio Galvão, colocando lâmpadas de mercúrio a vapor, repondo o busto de Anísio Galvão, as referidas Praças são no coração da cidade.”

 

O grifo nosso dá destaque a expressão “repondo o busto” o que significa que ali não mais estava e mais ainda que fosse algo recente, uma vez que nas buscas feitas nos arquivos da Câmara de Vereadores esta foi a primeira referência sobre o busto. Por outro lado, ao requerer a melhoria na iluminação o vereador mostra o descuido com o parque, que, diga-se de passagem, não teve o devido zelo por parte da edilidade municipal, sendo relegado a quase extinção tamanha foram às intervenções que o desfiguraram por completo.

O parque em 1951 com sinais de deterioração.
Fotografia Jornal de Pesqueira - 1989.

Lamentável que o segundo jardim a existir em Pesqueira, graças à abnegação de amigos e admiradores que com muito custo o construíram tenha tido esse fim, que bem merecia ser corrigido. E mais ainda por carregar o nome de Anísio Galvão, o homem das letras que tão bem soube escrever e descrever as emoções em crônicas, poesias e discursos. 

 

Patrono da Câmara de Vereadores

 

Casa Anísio Galvão.

O vereador e líder do PSD Luiz Neves apresentou na Câmara de Vereadores na sessão de 20 de agosto de 1952 o Projeto de Lei nº 204/52 dando a denominação de Rua Anísio Galvão ao trecho que passa em frente ao parque compreendido entre a antiga sede da Prefeitura Municipal - atual Polo da UAB/UFRPE e a Praça Comendador José Didier. O referido projeto foi aprovado por unanimidade em 2ª discussão no dia 22 de agosto e promulgado na mesma data pelo presidente do legislativo municipal, vereador Enedino de Freitas Mendonça.

Na sessão de 26 de agosto de 1959, o vereador pelo PTB Maviael Lopes da Costa apresentou os projetos nº 28 e nº 29, o primeiro propunha que a Câmara Municipal passasse a se chamar Casa Anísio Galvão e o segundo previa a abertura de um crédito de Cr$ 3.000,00 (três mil cruzeiros) para ampliação de um retrato cujo quadro deveria ser colocado no salão do legislativo.  

Maviael Lopes (1929-2004), vereador na legislatura 1955-1959.
Fotografia cortesia de sua neta Mayana Lopes.


A louvável iniciativa do vereador Maviael Lopes foi aprovada por unanimidade pelos seus pares presentes à sessão: Enedino de Freitas, Luiz Rocha, Maria do Carmo Freitas, José Miranda Primo e Antônio Soares de Macedo. Com isso, a histórica Casa Legislativa de Pesqueira funcionando como Câmara Municipal desde 1836 prestou uma grande homenagem a Anísio Galvão ao torná-lo seu Patrono em 29 de agosto de 1959 com a promulgação do Projeto de Resolução nº 9/1959. 

                            “CÂMARA MUNICIPAL DE PESQUEIRA. Resolução nº 9/1959
                            
A Câmara Municipal de Pesqueira resolve:

Artigo I — A Câmara Municipal de Pesqueira passa a denominar-se também CASA DE ANÍSIO GALVÃO, numa justa homenagem ao grande jornalista pesqueirense e homem de letras desaparecido.

Artigo II — A Comissão de Legislação providenciará sobre o que determina o Art. 191 da Constituição do Estado.

Artigo III — Sendo a Câmara autônoma, naquilo que se relaciona com qualquer modificação no seu âmbito interno, depois de aprovada esta Resolução, obedecidas as formalidades legais, a Comissão Executiva fará a devida promulgação desta Lei.

Artigo IV — Revogam-se as disposições em contrário.

Sala das Sessões da Câmara Municipal de Pesqueira, em 29 de agosto de 1959. Enedino de Freitas Mendonça (Presidente). Petronilo Rodrigues de Freitas (pelo 1º Secretário) e José Miranda Primo (servindo de 2º Secretário).” (Wilson, 1986, p.27)

 

Justo reconhecimento, tendo em vista que foi proposta do deputado Anísio Galvão o dispositivo nº 1774 na lei orçamentária do Estado em 1926 solicitando a cedência do prédio onde funcionava a Câmara para o município de Pesqueira a fim de que fosse adaptado para servir como sede do Paço Municipal, Fórum e Tribunal do Júri, além de ser mantida a Câmara de Vereadores, o que foi atendido pelo ato nº 1597 de 06/11/1926 assinado pelo presidente da Assembleia Legislativa e governador interino, Dr. Júlio de Melo.

Tendo o historiador e prefeito José de Almeida Maciel (1926-1927) executado a remodelação do prédio fazendo a caiação, pintura e instalação elétrica ficando a Prefeitura de Pesqueira em ambiente adequado e com condições de conforto para atender a população.

Pois bem, a homenagem como patrono da Câmara de Vereadores constitui-se em algo que ainda mantém viva a memória do grande polígrafo pesqueirense, que tão bem soube honrar a tribuna legislativa estadual representando não só os interesses de Pesqueira, mas, de tantos municípios pernambucanos.

Anísio, cujo nome vem do verbo grego anyo, de fato foi a tradução literal do termo, era completo. Sua pena escrevia suave tal qual um pássaro em voo livre a contemplar as belezas que se escondem além do horizonte e a sua fala na tribuna soava cativante tal qual o canto do sabiá-laranjeira - suave, melodiosa e ao mesmo tempo forte como as raízes sertanejas.

Sua história, trajetória e memória resistem ao tempo, pois cada vez que uma poesia sua for lida, em cada reunião da Câmara que for mencionado o seu nome e, sobretudo, cada vez que o hino de Pesqueira for cantado dele lembraremos. Afinal, o grande escritor pesqueirense Luís Cristóvão dos Santos foi muito feliz quando escreveu no hino o verso: “Terra querida de Anísio Galvão, tu és bonita e mais risonha não há, teu nome trago no coração, oh Rainha do Ororubá!”

Anísio Galvão vive pelo seu legado e pela sua história escrita nas redações, nas poesias e nas prosas. Cada vez que lermos um texto dele lembraremos em sinal de respeito a sua memória e que motivaram estas linhas.

 Por Fábio Menino de Oliveira.

Referências Bibliográficas

A PROVÍNCIA — edições de 28/04/1925; 23/06/1925; 21/11/1925; 21/12/1926; 12/02/1927; 11/12/1928.

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